Última entrevista de delegado executado pelo PCC mostra que ele foi abandonado por Tarcísio: "Eu vivo sem proteção"

Em sua última entrevista, delegado executado pelo PCC expôs o abandono por parte do governo estadual. Ruy Ferraz era considerado o maior conhecedor da facção no Brasil. Sobreviveu a quatro atentados e foi responsável pela prisão de Marcola, líder máximo do grupo. Apesar de sua relevância, estava sem escolta e sem carro blindado. Sua execução expõe o fracasso da política de segurança de Tarcísio, em que a PM prefere ostentar truculência contra alvos menores para lacrar nas redes e alimentar o sadismo de uma parcela da sociedade, enquanto os verdadeiros chefes do crime seguem ganhando terreno

Ruy Ferraz Fontes


Felipe Borges
Pragmatismo Político

Na última entrevista que concedeu, o ex-delegado-geral de São Paulo, Ruy Ferraz Fontes, executado a tiros pelo PCC na segunda-feira (15), deixou claro que vivia sem qualquer segurança ou apoio do Estado. Em conversa gravada há duas semanas para um podcast da CBN e do jornal O Globo, ainda não publicada, Ruy afirmou: “Eu moro sozinho aqui, eu vivo sozinho na Praia Grande, que é o meio deles. Hoje, eu não tenho estrutura nenhuma, não tenho estrutura nenhuma…”.

Considerado um dos maiores especialistas do país no combate ao crime organizado, Ruy foi responsável por investigações centrais contra o Primeiro Comando da Capital (PCC). Ele sobreviveu a quatro atentados e participou diretamente da prisão de Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, líder máximo da facção. Mesmo com essa relevância, estava sem escolta, sem carro blindado e vivendo de forma desprotegida no litoral paulista.

Execução anunciada

Na tarde de segunda-feira, Ruy sofreu uma emboscada em Praia Grande. Câmeras de segurança registraram o momento em que criminosos o perseguem em um carro, forçando sua colisão contra um ônibus. Em seguida, os assassinos desembarcam e disparam contra o ex-delegado.

A execução não foi um ato isolado. Segundo o promotor Lincoln Gakiya, que investiga o crime organizado em São Paulo, o delegado estava jurado de morte pelo PCC desde 2006, quando idealizou a estratégia de transferir todas as lideranças da facção para a Penitenciária II de Presidente Venceslau. “O Ruy era o policial do país que mais entendia de PCC. Estava jurado de morte desde 2006. A ideia de concentrar as lideranças foi vista como uma afronta direta pelo crime organizado”, afirmou Gakiya.

Em 2010, o PCC já havia articulado um plano para assassiná-lo na saída do 69° Distrito Policial, na Zona Leste de São Paulo, mas a trama foi descoberta a tempo.

40 anos de polícia

Formado em direito pela Faculdade de São Bernardo do Campo, Ruy ingressou na Polícia Civil no início dos anos 1980. Ao longo de mais de 40 anos de carreira, atuou no Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), no Departamento Estadual de Investigações sobre Narcóticos (Denarc) e no Departamento de Polícia Judiciária da Capital (Decap).

Em 2019, foi nomeado delegado-geral da Polícia Civil pelo então governador João Doria (PSDB), cargo que ocupou até 2022. Tornou-se uma das principais referências no combate ao PCC e, consequentemente, um dos inimigos mais visados pela facção.

Fracasso da política de segurança de Tarcísio

A morte de Ruy expõe o contraste entre a grandiloquência do discurso oficial e a realidade do combate ao crime organizado em São Paulo. Enquanto a Polícia Militar de Tarcísio de Freitas concentra esforços em operações de espetáculo contra alvos pequenos — ações que rendem vídeos virais e aplausos de setores que se alimentam da truculência — figuras estratégicas como Ruy Ferraz foram deixadas sem qualquer proteção.

“[Ruy] esteve passo a passo nesse enfrentamento ao PCC, e ser executado dessa maneira mostra, infelizmente, o poderio do crime organizado”, resumiu Rafael Alcadipani, professor da Fundação Getulio Vargas e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

A ausência de medidas mínimas de segurança para um delegado jurado de morte há quase duas décadas é, por si só, reveladora. Ruy Ferraz Fontes morreu como viveu nos últimos anos: no front contra o PCC e abandonado pelo Estado que deveria defendê-lo.

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