QUANDO BOLSONARO VAI PARA O PRESÍDIO? ENTENDA OS PRÓXIMOS PASSOS APÓS A CONDENAÇÃO


Jair Bolsonaro foi condenado a mais de 27 anos de prisão em regime fechado, mas não será preso até que algumas etapas sejam superadas. A possibilidade de que o ex-presidente tente fugir do país também não pode ser descartada. Nesta semana, veio à tona um vídeo que revela plano de fuga que Renzo Gracie, mestre de Jiu-Jitsu, apresentou a Jair Bolsonaro

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) fixou nesta semana a pena de 27 anos e 3 meses de reclusão para o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro (PL), no processo que apurou a chamada “trama golpista” — conjunto de ações e articulações investigadas como tentativa de abolir, pela via da força, os pilares do Estado democrático de direito após a derrota eleitoral de 2022. A decisão, tomada por maioria, aponta Bolsonaro como figura central de uma organização criminosa que buscou usar aparato estatal e violência política para permanecer no poder.

Apesar da contundência da sentença, a efetivação da prisão não será imediata. A execução da pena depende do trânsito em julgado — isto é, do esgotamento dos recursos cabíveis — e da análise de medidas processuais que a defesa ainda pode apresentar. Enquanto o acórdão do julgamento não for publicado, e enquanto os prazos recursais estiverem em curso, a situação processual de Bolsonaro permanecerá em um limbo que abre espaço para manobras jurídicas e disputas políticas.

Em que pé está a execução da pena

A palavra-chave aqui é formalidade: a publicação do acórdão — documento que reúne votos e fundamentos do julgamento — é o gatilho para a multiplicação de prazos e recursos. A legislação prevê, entre outros instrumentos, os embargos declaratórios, com prazo de cinco dias após a publicação do acórdão, destinados a esclarecer obscuridades, contradições ou omissões. Depois deles, e dependendo do teor da decisão sobre esses embargos, ainda cabem outros recursos, como os chamados embargos infringentes, cujos efeitos, porém, são restritos pelo entendimento atual do STF (só são admitidos, em regra, se houver pelo menos dois votos pela absolvição). Em linhas gerais: recursos podem atrasar a execução, mas, na prática, nem sempre alteram o resultado final.

CNN Brasil

O STF tem até 60 dias para publicar o acórdão — prazo que, na rotina dos gabinetes, pode variar segundo a complexidade do voto e a agenda administrativa. Só após essa publicação iniciam-se formalmente os prazos que poderão manter Bolsonaro fora do cumprimento imediato da pena.
Agência Brasil

Onde Bolsonaro poderia cumprir a pena

Há quatro hipóteses que vêm sendo ventiladas nos corredores jurídicos e nos gabinetes do Distrito Federal sobre o local do cumprimento: 1) Complexo da Papuda (penitenciária federal situada em Brasília); 2) uma unidade da Polícia Federal no Distrito Federal, em sala ou ala especial; 3) instalações sob tutela do Exército; ou 4) prisão domiciliar, mantida por decisão judicial. Cada alternativa traz implicações práticas e políticas.

Se o STF determinar a ida para a Papuda, Bolsonaro poderia inicialmente cumprir pena em cela comum, ainda que existam mecanismos para mantê-lo isolado de detentos de maior periculosidade ou com regalias relativas — um tratamento que visa conciliar segurança, integridade física e ordem institucional. Outra alternativa já testada em casos de alto perfil no passado é a permanência em dependências da Polícia Federal — um modelo que lembra a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Curitiba entre 2018 e 2019, quando o uso de instalações federais foi empregado para garantir segurança e evitar incidentes. Há precedentes práticos e logísticos para ambas as escolhas.

A terceira via — instalação militar — é menos provável juridicamente, porque o uso de quartéis para cumprimento de pena é excepcional e conflita com regras constitucionais sobre a vedação de encarceramento em instituições militares. Ainda assim, a hipótese circula no debate público como reflexo da capitalização política que a defesa e simpatizantes tentam obter para pleitear tratamento “especial”.

Por fim, a prisão domiciliar figura como pedido previsível: a defesa já sinalizou que utilizará argumentos ligados à idade avançada e a problemas de saúde para solicitar o cumprimento da pena em casa, possivelmente com tornozeleira eletrônica. Essa alternativa, se aceita, transformaria o desfecho prático da condenação — seria, na prática, um regime muito distinto do regime fechado fixado na sentença — e alimentaria novas disputas jurídicas e políticas.

Papel de Alexandre de Moraes e da Primeira Turma

A eventual ordem para que Bolsonaro inicie o cumprimento da pena caberá ao ministro Alexandre de Moraes, relator do processo e responsável por despachos e decisões de execução. Como advertem especialistas em direito penal, qualquer mudança de regime (do atual estágio à execução em regime fechado, por exemplo) terá de ser “devidamente motivada” pelo relator — cuja caneta, nas próximas semanas, será central para definir prazos, aceitar ou não pedidos de efeito suspensivo e encaminhar questões à Procuradoria-Geral da República para manifestação.

A estratégia de recursos da defesa: prazos, instrumentos e efeitos

A estratégia defensiva deverá necessariamente passar pela utilização de todos os prazos e remédios constitucionais disponíveis: impugnações ao acórdão, embargos declaratórios e, se cabível, embargos infringentes. Ainda que muitos desses instrumentos sejam de caráter protelatório e raramente modifiquem o resultado final quando o placar é claro, eles cumprem papel prático: adiam a execução por tempo suficiente para que medidas políticas, negociações ou mesmo fatos novos — por exemplo, pedidos de habeas corpus a instâncias superiores — possam surgir. Advogados ouvidos publicamente por veículos jurídicos já anteciparam a intenção de esgotar as vias internas e, se for o caso, buscar instâncias internacionais.

O plano de fuga que veio à tona

Ao mesmo tempo em que o desenrolar jurídico se desenha, a exposição pública do suposto “plano de fuga” ganhou palco nesta quinta. Um vídeo divulgado pelo portal ICL Notícias traz o lutador e treinador Renzo Gracie relatando que, durante a estadia de Bolsonaro em Miami em 2023, um “presidente de um país” teria oferecido transporte e refúgio ao ex-chefe do Executivo — proposta que, segundo Renzo, teria sido recusada por Bolsonaro, que preferiu voltar ao Brasil “mesmo que isso custe a minha liberdade”. O material viralizou e foi repercutido por diversos veículos.

No vídeo, Renzo adiciona uma dimensão de intimidade e intriga: afirma ter sido incumbido de entregar um telefone bloqueado ao ex-presidente e relata episódios que envolvem, em tom coloquial, ministros do STF e ameaças — alegações que, se confirmadas, reforçam a complexidade das redes de poder que orbitavam a Presidência e seus aliados. Há, contudo, diferenças essenciais entre narrativa oral e prova processual: declarações em encontros privados e vídeos de terceiros podem alimentar a percepção pública, mas não substituem provas técnicas ou testemunhais passíveis de instrução em juízo. As menções a oferecimentos de exílio e a eventuais tensões entre ministros do STF entram no território da política midiática e exigem cautela ao serem usadas como evidência judicial.
O impacto político e social

A condenação de um ex-presidente por tentativa de golpe de Estado é um fato inédito na história recente do país e tem repercussões profundas: ruas divididas entre celebração e indignação; governos e lideranças latino-americanas que se pronunciam; e um tabuleiro político realinhado para além do processo específico. A decisão do STF reaviva memórias de erosão institucional e coloca no centro do debate a pergunta sobre como sociedades democráticas lidam com lideranças que tentam subverter regras do jogo eleitoral.

No campo internacional, a condenação também ressoa. Ela oferece munição tanto a críticos da gestão Bolsonaro — que a leem como vitória da Justiça — quanto a aliados estrangeiros que denunciam “vitimização” e tratam o episódio como perseguição política. Essa duplicidade de leituras amplia a incerteza sobre o que virá a seguir: menos um único desfecho jurídico, mais um conjunto de trajetórias que entrelaçam tribunais, parlamentos, mídia e manifestações de rua.

O retrato social: idade, saúde e a questão do tratamento penal diferenciado

Argumentos médicos e de vulnerabilidade por idade costumam ser invocados em pedidos de prisão domiciliar. No caso concreto, a defesa já adianta que questões de saúde e idade avançada integrarão a petição. Juristas lembram que o ordenamento penal prevê tratamento diferenciado quando a execução da pena põe em risco a vida ou a integridade física do condenado. Mas tal argumento encontra limites quando a gravidade do crime e o risco à ordem pública são elevados — circunstâncias que, no entendimento de parte do Ministério Público e de setores do Judiciário, podem pesar contra a concessão de privilégios. Em suma: o debate sobre prisão domiciliar terá de conciliar garantias individuais e interesse coletivo pela segurança jurídica e pela prevenção de riscos institucionais.

O espectro da impunidade e a sensação de precedentes

Há dois vetores de leitura sobre os próximos capítulos. Um, sustentado por juristas e setores democráticos, afirma que a condenação é um marco no enfrentamento de tentativas de ruptura institucional e que o processo deverá seguir seu curso até suas últimas consequências. Outro, defendido por aliados políticos e por parcela significativa da base bolsonarista, enxerga nas manobras recursais e no uso de prazos um arsenal legítimo de defesa e apela para narrativas de perseguição que podem mobilizar massa e voto. O resultado prático — se a pena será cumprida em regime fechado, em unidade especial, ou em domicílio — dependerá dessa tensão entre técnica jurídica, cálculo político e decisões individuais de magistrados como Alexandre de Moraes.

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