DEPOIS DA UE E SUÍÇA, TARIFAÇO CHEGA AO BRASIL

por Rui Martins


                                                                                                   Foto: Markus Winkler/Pexels

Quem viu a presidente da Suíça confessar a impotência da Suíça, “um país pequeno”, disse ela, para fazer frente ao presidente Trump, imaginou que dias difíceis viverá o Brasil, mesmo sendo um país muito maior! Mas não poderia imaginar a ousadia de Trump em desfechar uma tentativa de atentado à soberania brasileira, utilizando da pressão econômica e política contra o STF e contra o governo brasileiro.

Ainda há alguns dias, Trump reafirmava indiretamente estar decidido a punir o Brasil ao mostrar, numa entrevista, sua preocupação por Bolsonaro, definindo-o como um homem de bem injustiçado, que não deveria ser processado. Os temores se confirmaram com a decisão do presidente Trump de utilizar o tarifaço como instrumento político e de chantagem contra o Brasil, mais especificamente contra o ministro do STF Alexandre de Moraes, enquadrando-o na lei Magnitsky.

No domingo, numa propriedade de Trump na Escócia, era a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, praticamente obrigada a apertar a mão de Trump, que “comemorava” a celebração de um acordo comercial de exportação e importação do bloco com os Estados Unidos, considerado uma derrota pela maioria da imprensa e políticos europeus, um acordo qualificado de capitulação, humilhação e submissão pela correspondente do jornal suíço Le Temps.

O tarifaço imposto por Trump à Suíça é de 31% e as negociações prosseguem nos EUA, mas, como diz a presidenta Karin Keller-Sutter, às vésperas da Festa Nacional suíça, “nós não somos uma superpotência. Temos uma certa força econômica, mas não política, temos de levar isso em conta. Agora está nas mãos dos Estados Unidos, nas mãos do presidente Donald Trump”.

Com esse tipo de capitulação declarada, a Suíça dá a impressão de não estar negociando com Trump, mas esperando um favor. Porém, antes dessa declaração ser tomada como submissão e aceitação de uma derrota, a presidenta suíça acrescenta, numa tentativa de salvar as aparências: “mas não devemos nos fazer menores do que somos”.

Difícil de reagir diante de um Trump prepotente, cheio de si, capaz mesmo de dar um ultimato a Putin para acabar com a guerra à Ucrânia, valendo-se de sua maioria absoluta na Câmara, Senado e na Suprema Corte, agindo com a arrogância de um ditador ou imperador absolutista.

A orgulhosa alemã Ursula von der Leyen, representando os 27 países da União Europeia, foi obrigada a ir à Escócia para negociar com Trump, no intervalo de suas partidas de golfe, e obter a diminuição das tarifas aduaneiras de 30% a 15% para os produtos europeus exportados para os EUA, enquanto os produtos norte-americanos entrarão livremente na Europa.

Uma verdadeira capitulação contra a qual os europeus não vão usar o instrumento anticoerção, a prometida “bazuca europeia” contra a pressão de Trump. A União Europeia terá de comprar petróleo, seus derivados, armamentos e investir nos EUA uma parte de sua economia, sem contrapartida dos norte-americanos. Até agora, só a China foi capaz de peitar o superpresidente Trump.

Um ex-presidente do Banco Mundial, Prêmio Nobel de Economia de 2001, Joseph Stiglitz, elogiou a atual resistência do presidente Lula ao tarifaço de Trump e esperava reação semelhante, que não houve, de outros líderes mundiais. Tão logo foi conhecida a decisão de Trump de manter o tarifaço contra o Brasil, acompanhado do vergonhoso enquadramento do ministro Alexandre de Moraes na lei Magnitsky, o presidente Lula, falando em nome de todos os brasileiros, repudiou o ataque de Trump à independência e à soberania brasileira.

O economista Stiglitz também se referiu ao ataque dos seguidores de Bolsonaro aos prédios dos Três Poderes, em Brasília, já presos e punidos severamente, e ao ataque do Capitólio pelos seguidores de Trump, já anistiados, afirmando serem mais firmes as instituições brasileiras.

Outro Prêmio Nobel de Economia, em 2008, Paul Krugman, defendeu a decretação de um impeachment de Trump depois de ter taxado em 50% as exportações brasileiras.

E aqui, diferentemente das taxas aduaneiras para a Suíça e União Europeia, entra outro fator. O tarifaço contra o Brasil não é só uma regulamentação econômica aduaneira, mas tem um objetivo político: punir o Brasil e utilizar o tarifaço como chantagem contra os ministros do STF para proteger o ex-presidente Bolsonaro, prestes a ser condenado à prisão por tentativa de golpe para implantar uma ditadura no Brasil.

Os dois prêmios Nobel de Economia não falaram, mas Trump parece agora também interessado em utilizar o tarifaço para fazer chantagem com o Brasil, a fim de permitir aos EUA a exploração dos minerais estratégicos brasileiros.

Mostrando ser um especialista em chantagens, Trump parece oferecer ao Brasil, com a entrega da exploração dos minerais estratégicos aos EUA, uma variante à anulação do processo de Bolsonaro e a decretação de anistia geral aos golpistas. Essa variante eliminaria o atual despertar do nacionalismo em defesa das instituições brasileiras, contra a ameaça de pressão e intervenção norte-americanas no Executivo e no Judiciário.

Uma reação visível no distanciamento de uma parte da direita à armadilha montada, nos EUA, pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro com apoio de Paulo Figueiredo, neto do ditador João Figueiredo, para salvar Jair Bolsonaro ao preço de uma crise econômica no Brasil. A trama de Eduardo Bolsonaro, pela qual tem sido qualificado como entreguista e traidor da pátria, tem provocado crescimento de Lula nas sondagens, divergência entre os líderes do agronegócio e queda dos prováveis candidatos bolsonaristas à presidência Tarcísio, Zema e Caiado.

Algumas referências:










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Rui Martins é jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu “Dinheiro Sujo da Corrupção”, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, “A Rebelião Romântica da Jovem Guarda”, em 1966. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI.

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Jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu Dinheiro sujo da corrupção, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, A rebelião romântica da Jovem Guarda, em 1966. Foi colaborador do Pasquim. Estudou no IRFED, l’Institut International de Recherche et de Formation Éducation et Développement, fez mestrado no Institut Français de Presse, em Paris, e Direito na USP. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI.

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