EX-VENDEDOR CRIA ECOBARREIRA PARA LIMPAR RIO DE INFÂNCIA E GANHA APOIO APÓS DENÚNCIA DE VIZINHO: 'ACABOU ME AJUDANDO'

Diego Saldanha criou projeto sustentável no PR que auxilia na retirada de resíduos do fluxo d'água e agora leva a ideia para outras regiões

Por:Catarina Carvalho, do Rio de Janeiro
                                                                                                              Foto: Reprodução/Instagram
Paranaense criou barreira ecológica para limpar resíduos do rio Atuba

No final dos anos 1960, Paulinho da Viola resolveu declarar seu amor à escola de samba do coração com versos que ficaram na história da música popular brasileira. “Foi um rio que passou em minha vida/ E meu coração se deixou levar”, canta no samba. A letra exalta a Portela, mas bem que poderia se encaixar na vida de Diego Saldanha.

As lembranças da infância do ex-vendedor foram construídas às margens do rio Atuba, em Colombo, no Paraná. Era naquele fluxo d’água que moravam as memórias mais divertidas, com direito a mergulhos e brincadeiras. Até que o lugar marcante sucumbiu à poluição e aos descartes da vizinhança.

“No passado, eu via o rio limpo, com peixes, as pessoas nadando. O tempo passou e o transformou num corredor de lixo”, lamenta.

                                                        Foto: Reprodução/Instagram
                  Diego Saldanha lamenta falta de convite para a COP30 em Belém

Inquieto, ele começou a pensar em alternativas para mudar o curso dessa história. Em 2016, Diego juntou algumas garrafas PET de dois litros, uma rede e outros materiais recicláveis. Assim, ele conseguiu construir sua primeira Ecobarreira.

“Era bem simples, mas cumpria o papel de segurar os resíduos que desciam pelo Atuba. Eu queria fazer algo por ele, queria trazer uma vida melhor para o rio que fez parte da minha infância”, explica.
                                                                                       Foto: Reprodução/Instagram
Primeiras ecobarreiras criadas por Diego Saldanha foram produzidas em 2016

'Não vou conseguir salvar o mundo sozinho'

Nascida no improviso, a Ecobarreira se modernizou e é hoje muito mais eficiente, como conta Diego: “É uma balsa flutuante e tem uma esteira que é movida a energia solar”, detalha.

Com o aparato, as limpezas ocorrem periodicamente, a depender da quantidade de resíduos. “Sempre uma vez na semana, às vezes a cada 15 dias. Quando chove, por exemplo, eu faço esse trabalho.”

Segundo Diego, todo o resíduo retirado pela Ecobarreira é doado para uma cooperativa de reciclagem parceira do projeto, que consegue fazer uma renda com esse trabalho.

Mesmo com os esforços, a barreira ecológica não é o suficiente para a retirada de todos os rejeitos. “O que está submerso acaba escapando da ecobarreira. Eu fico um pouco triste por não conseguir barrar, mas também entendo que eu não vou conseguir salvar o mundo sozinho. Por outro lado, a gente fica feliz de recolher toda aquela ‘sujeirada’ que fica parada na barreira”, desabafa.
                                                                                     Foto: Reprodução/Instagram
                               Iniciativa ganhou apoio e visibilidade nas redes sociais

Iniciativa viralizou após denúncia de vizinho

Quando pensou em construir uma barreira ecológica para salvar o rio que marcou sua infância, Diego não esperava receber atenção nas redes sociais ou fazer da função o seu sustento. A ideia era apenas encontrar uma solução para resolver uma situação que já estava insustentável.

A ação, no entanto, não agradou a todos. Parte da vizinhança celebrou a iniciativa, mas teve quem torcesse o nariz com o trabalho do paranaense. Em 2023, um vizinho ficou tão incomodado que resolveu denunciá-lo.

“Segundo ele, era desvio de curso de água. Mas os policiais ambientais foram educados comigo. Mostrei todo o projeto e, para a minha surpresa, eles já conheciam e ficaram ainda mais encantados com o que viram”, relembra.

No fim da conversa, os agentes parabenizaram Diego pelo trabalho e decidiram arquivar a denúncia. “Engasgado” com o constrangimento, o ex-vendedor decidiu expor o ocorrido nas redes sociais. O vídeo, segundo ele, foi uma virada de chave completa.

“Hoje, tem 22 milhões de acessos e me trouxe mais de meio milhão de seguidores. Foi a partir dali que eu me coloquei como um grande influenciador e consegui tocar o meu projeto mais tranquilo, por meio de de uma denúncia de uma pessoa. A pessoa que quis fazer o mal, acabou me ajudando”, conta.

'Com o peito e a coragem'

Atualmente, Diego tem mais de 1 milhão de seguidores apenas no Instagram e dá palestras sobre iniciativas ecológicas em todo o Brasil. Segundo ele, a atenção nas redes sociais lhe trouxe muitas oportunidades de apoio.

"Comecei apenas com o peito e a coragem, como a gente diz aqui. Não tinha parte financeira, era muito difícil. Sempre quis ampliar o projeto, modernizar, mas absolutamente tudo precisa de dinheiro, né? Então eu tinha que me virar como eu podia", admite.

Com a repercussão da iniciativa, o cenário se tornou mais otimista. “O governo do estado do Paraná tem se aproximado e tentado apoiar de alguma forma. A Sanepar [Companhia de Saneamento do Paraná], que é pública e privada, tem me apoiado”, lista.

“O próximo passo é ampliar o meu projeto para outros rios aqui de Curitiba, região metropolitana, e até mesmo do estado do Paraná com o apoio da Sanepar e do governo. Mas essa parceria é recente e creio muito devido a todo o sucesso nas redes sociais”, emenda.
                                                         Foto: Reprodução/Instagram
               Diego também criou a eco peneira, que ajuda a limpar resíduos nas praias

Além do impacto ambiental na região de Colombo, Diego também acredita que o projeto das barreiras ecológicas abriu os olhos da população para a poluição no local.

“É claro que nem todas as pessoas entendem a importância, mas tenho certeza que 90% das pessoas entendem que é preciso cuidar do rio. Os primeiros afetados seremos nós que moramos próximos. Hoje, a comunidade local vem visitar o projeto. Também procuro trazer escolas para que entendam de que forma que a gente cuida do rio aqui”, detalha.

Do Sul ao Norte com a Ecobarreira

De 2016 para cá, Diego viralizou, modernizou a ecobarreira e até criou outras empreitadas ecológicas, como a ecopeneira. O artefato que ajuda a limpar as praias chamou a atenção de marcas grandes do mercado nacional, que procuraram o ex-vendedor para promover ações sustentáveis. "É um equipamento que eu também comercializo", explica.

A expansão do projeto ecológico ganhou novos contornos neste ano, com a expectativa para a COP30 em Belém, no Pará. Diego saiu do sul do Brasil para implementar uma ecobarreira no Norte, a convite da Prefeitura de Belém.

"Tem uma ecobarreira funcionando lá em Belém, que vai ser mostrada na COP. Produzimos em 10 dias. Fui eu e a minha equipe", conta Diego, que ainda não recebeu convite formal, mas espera poder participar da própria conferência. “Não posso dizer que eu não quero participar. Para quem lida com o meio ambiente e vive isso no dia a dia, é a mesma coisa de um jogador de futebol participar de uma Copa do Mundo. Então minha expectativa está bem grande."


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