PENTÁGONO DEMITE CHEFE DE INTELIGÊNCIA APÓS RELATÓRIO CONTRADIZER VERSÃO DE TRUMP SOBRE ATAQUE AO IRÃ

Medida ocorre semanas após documento afirmar que a ação americana apenas atrasou o programa nuclear iraniano em alguns meses

Por Julian Barnes e Eric Schmitt, Em The New York Times — Washington

Pentágono apresenta cronograma operacional de ataque ao Irã durante entrevista coletiva em Washington, nos EUA Andrew Harnik/ AFP

O Pentágono demitiu o chefe da Agência de Inteligência de Defesa (DIA, na sigla em inglês), informaram nesta sexta-feira um alto funcionário da Defesa e um senador. A decisão ocorreu semanas depois de a agência ter elaborado um relatório preliminar que contradizia a declaração do presidente Donald Trump de que as bases nucleares do Irã haviam sido “aniquiladas” pelos ataques militares dos Estados Unidos.

O tenente-general da Força Aérea Jeffrey Kruse é o mais recente alto funcionário do Pentágono — e o segundo principal oficial de inteligência militar — a ser afastado desde o retorno de Trump ao cargo. O general Timothy Haugh, chefe da Agência de Segurança Nacional (NSA), já havia sido destituído meses atrás após reclamações de um teórico da conspiração de direita.

O senador Mark Warner, da Virgínia, democrata mais graduado no Comitê de Inteligência do Senado, disse que a demissão de Kruse, que teve uma longa carreira de serviço apartidário, é preocupante.

— A demissão de mais um alto funcionário de segurança nacional ressalta o perigoso hábito da administração Trump de tratar a inteligência como um teste de lealdade, em vez de como uma salvaguarda para nosso país — disse Warner.

O alto funcionário da Defesa, que não estava autorizado a falar publicamente, afirmou que Kruse não continuará como diretor da agência, embora não esteja claro se lhe será oferecido outro posto na Força Aérea ou se ele se aposentará. Dois assessores do Congresso disseram que parlamentares foram notificados nesta sexta-feira de que o secretário de Defesa, Pete Hegseth, havia demitido Kruse por “perda de confiança” no oficial.

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Dias após os ataques militares dos EUA contra três bases nucleares iranianas em junho, a DIA elaborou uma avaliação preliminar sugerindo que o programa nuclear de Teerã havia sido atrasado apenas alguns meses. Relatos da CNN e do The New York Times sobre essa avaliação provocaram forte reação da Casa Branca.

Nos dias seguintes, a Casa Branca e altos funcionários de inteligência tentaram construir um quadro diferente, de uma operação mais bem-sucedida contra o Irã.

Warner ligou diretamente a demissão de Kruse à avaliação da agência sobre a operação.

— Esse tipo de análise honesta e baseada em fatos é exatamente o que deveríamos esperar das nossas agências de inteligência, independentemente de favorecer ou não a narrativa da Casa Branca — disse o senador. — Quando a expertise é descartada e a inteligência é distorcida ou silenciada, nossos adversários ganham vantagem e a América fica menos segura.

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A demissão de Kruse foi noticiada anteriormente pelo The Washington Post.

Não está claro quem substituirá Kruse, um veterano da Força Aérea com 34 anos de serviço, que ocupou diversos cargos de inteligência em Washington e no exterior, incluindo funções de supervisão das operações de inteligência militar no Afeganistão, Paquistão e região do Indo-Pacífico.

Vários ex-altos funcionários de inteligência disseram que Kruse se tornou alvo desde os primeiros dias do segundo governo Trump.

Uma visita de integrantes da equipe de eficiência governamental de Elon Musk à sede da DIA, no início deste ano, foi desastrosa. Membros da equipe de Musk do Departamento de Eficiência Governamental (Doge, em inglês), concluíram que a agência era inchada e tinha missões mal definidas, relatou um ex-alto funcionário.

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Outro ex-funcionário afirmou que o governo Trump estava insatisfeita com o lento desenvolvimento de uma ferramenta de banco de dados e queria que Kruse a abandonasse em favor de sistemas comerciais. A ferramenta, chamada MARS, pretende facilitar a gestão de dados de inteligência. Vem sendo desenvolvida há anos, sob múltiplas administrações.

Após a divulgação da avaliação preliminar da agência sobre os ataques militares ao Irã, alguns funcionários da Casa Branca passaram a destacar que Kruse havia sido nomeado durante o governo Biden. Segundo um funcionário, parte do governo Trump quer substituir todos os líderes militares indicados pelo ex-presidente.

Outros integrantes do governo consideravam a DIA grande demais e estavam impacientes por mudanças rápidas.

A agência foi criada para ser a principal central de inteligência das Forças Armadas, com a expectativa de substituir os esforços individuais de cada ramo militar. Mas o Pentágono nunca chegou a extinguir as demais agências de inteligência.

Assim, a Agência de Inteligência de Defesa acabou se tornando, segundo um ex-funcionário da Defesa, “a casa dos brinquedos rejeitados” — responsável por missões e tarefas que ninguém mais queria ou precisava.

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