ATAQUE AOS PILARES QUE SÃO BASE DE NOSSA SOCIEDADE CONTINUARÃO SENDO ABALADAS NESTE GOVERNO

Os ataques de ódio promovidos por militantes extremistas tiveram um novo episódio dia 08 de setembro de 2021, em Brasília (DF). Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tentaram invadir a sede do Ministério da Saúde (MS), na Esplanada dos Ministérios, e hostilizaram jornalistas.

Os bolsonaristas foram contidos pela segurança da instituição, que depois contou com a presença da Polícia Militar (PM) no local. Algumas equipes de imprensa, como as das emissoras Record e CNN, precisaram se abrigar dentro do prédio e aguardar a escolta dos agentes para ter maiores condições de segurança ao deixar o ministério.

DIAS ANTES DESTE VANDALISMO!

Durante um evento com apoiadores no município de Tanhaçu (BA), o chefe do Executivo disse que os protestos agendados para o 7 de Setembro seriam um “ultimato” para dois magistrados da Corte.

“Nós não criticamos instituições ou poderes. Somos pontuais. Não podemos admitir que uma ou duas pessoas, usando da força do poder, queiram dar outro rumo para o nosso país. Essas uma ou duas pessoas têm que entender o seu lugar. E o recado de vocês, povo brasileiro, nas ruas na próxima terça, dia 7, será um ultimato pra essas duas pessoas”, discursou. 

Mas o que dizer do voto monocrático para livrar o deputado Francisquini?
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* A
28 DE OUTUBRO 2021

DEPUTADO FRANCISCHINI FOI CASSADO POR PROPAGAR DESINFORMAÇÃO CONTRA URNA ELETRÔNICA

Decisão da Corte Eleitoral é inédita e cria jurisprudência para casos semelhantes a partir das próximas eleições



Por seis votos a um, o Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou o mandato e tornou inelegível o deputado estadual eleito pelo Paraná, em 2018, Fernando Destito Francischini, por divulgar notícias falsas contra o sistema eletrônico de votação. A decisão ocorreu hoje, 28 de outubro e condenou o deputado por uso indevido dos meios de comunicação, além de abuso de poder político e de autoridade, práticas ilegais previstas no artigo 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei de Inelegibilidade).

Francischini ocupava o cargo de deputado federal naquele ano e foi o candidato mais votado para deputado estadual, com quase 428 mil votos. No dia da eleição, ele fez uma live para espalhar notícia falsa de que duas urnas estavam fraudadas e aparentemente não aceitavam votos no então candidato à Presidência da República Jair Bolsonaro. Na transmissão, ele também afirmou que urnas tinham sido apreendidas e que ele teria tido acesso a documentos da Justiça Eleitoral que confirmariam a fraude.

O boato propagado pelo parlamentar surgiu depois que começaram a circular na internet dois vídeos que tentam mostrar suposta dificuldade em votar em Bolsonaro, quando o eleitor chega à urna e tenta, de imediato, apertar as teclas do número 17. Ocorre que os vídeos evidenciaram erro do eleitor e foram prontamente esclarecidos pela Justiça Eleitoral, sendo desmentido também o rumor sobre a suposta apreensão de urnas, que nunca ocorreu. Quando a urna eletrônica apresentou a tela para votar no cargo de governador, o eleitor apertou as teclas 1 e 7 para votar para presidente. É visível nos vídeos a palavra GOVERNADOR, na parte superior da tela da urna eletrônica. O Tribunal Regional Eleitoral paranaense (TRE-PR) julgou improcedente a ação movida pelo Ministério Público Eleitoral (MPE), que recorreu ao TSE e reverteu o resultado.
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* A - https://www.tse.jus.br/

A derrota do fascismo e das fake news

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''Transcrevo trecho do voto do ministro Edson Fachin, presidente do TSE, que fez, entre os três que derrotaram a tese bolsonarista, a defesa mais vigorosa da eleição e da democracia:''

“O pressuposto básico da democracia é aquele segundo o qual há acordo sobre as regras do jogo político. Não pode um partido político, muito menos um candidato ou agente político eleito, agir contra a democracia. Não há direito fundamental para a propagação de discurso contrário à democracia. (…) O silêncio desse Supremo Tribunal Federal diante de tal prática configuraria grave omissão constitucional e descumprimento de suas nobres atribuições”.

*1 Redação Pragmatismo Político


ACABANDO DO O ENSINO PÚBLICO

Bolsonaro cortou R$ 6 bilhões de repasses para universidades federais


Levantamento feito pelo Inesc mostra que execução financeira para o ensino superior foi de R$ 40,65 bi para R$ 34,82 bi entre 2019 e 2021
Edoardo Ghirotto

Marcelo Camargo/Agência Brasil

O governo de Jair Bolsonaro cortou cerca de R$ 6 bilhões dos repasses feitos para universidades federais desde 2019. Segundo um levantamento produzido pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), a execução financeira para o ensino superior foi de R$ 40,65 bilhões no primeiro ano de mandato para R$ 34,82 bilhões no ano passado.

A verba autorizada pelo governo federal para ser gasta com o ensino superior sofreu queda de R$ 6,5 bilhões. O montante era de R$ 42,62 bilhões em 2019, mas foi reduzido para R$ 36,09 bilhões em 2021.


A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) foi uma das mais atingidas pelos cortes. O governo federal havia autorizado um repasse de R$ 4,1 milhões em 2019, mas reduziu o valor para R$ 3,3 milhões neste ano.

A assessora política do Inesc, Cleo Manhas, afirma que os cortes nos repasses impediram “o aumento das matrículas, a substituição de professores que se aposentaram, a manutenção e ampliação dos espaços e dos projetos de pesquisa, as bolsas para a pós-graduação, dentre outras ações fundamentais para um país que pretende ter pensamento autônomo”.

Os dados fazem parte de um estudo que o Inesc divulgará nesta segunda-feira (11/4) com análises dos três anos da gestão Bolsonaro nas áreas de saúde, educação, direito à cidade, meio ambiente, indígenas, quilombolas, igualdade racial, mulheres e crianças e adolescentes. FONTE: AGÊNCIA BRASIL
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Militares propõem acabar com o SUS e internautas reagem com a tag #CalaABocaMilico

Documento de militares, entregue ao vice-presidente, vaza, internautas se revoltam com proposta de acabar com a gratuidade do SUS e sobem a hashtag #Calaabocamilico
Escrito por: Redação CUT | Editado por: Marize Muniz


REPRODUÇÃO/INSTITUTO GENERAL EDUARDO VILLAS BÔAS
Generais Eduardo Villas Bôas e Hamilton Mourão


Um documento elaborado por militares com propostas até 2035, que prevê o fim da gratuidade no atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS) e do ensino superior, entre outras perversidades, revoltou os brasileiros e a hashtag #CalaABocaMilico foi parar entre os assuntos mais comentados do Brasil no Twitter.

Em evento realizado na quinta-feira (19) da semana passada, os institutos Villas Bôas, Sagres e Federalista apresentaram o chamado ‘Projeto de Nação, O Brasil em 2035’, um documento de 93 páginas que trata de 37 temas considerados estratégicos pelos militares. O primeiro a receber o documento foi o vice-presidente, general Hamilton Mourão.

A ideia dos militares é que, em um eventual segundo mandato de Jair Bolsonaro (PL) na presidência da República - ou a eleição de outro político de extrema direita -, a partir de 2025, o governo passe a cobrar pelo atendimento no SUS e que a classe média passe a pagar mensalidades nas universidades públicas.

Quando falamos que as eleições deste ano definirão o futuro do país, que serão as eleições das nossas vidas, é a esse tipo de proposta perversa e contrária aos interesses dos trabalhadores e trabalhadoras e da grande maioria da sociedade que estamos nos referindo, diz o secretário de Administração e Finanças da CUT, Ariovaldo Camargo.

“O que está em jogo não é só a questão de quem vai governar o Brasil e, sim, qual o Brasil que vem aí se não derrotarmos Bolsonaro nas eleições de 2 de outubro”, diz o dirigente.

“Esse governo representa o Brasil que vai cobrar por serviços de saúde e por universidade pública, como propõem os militares", acrescenta Ariovaldo, que destaca: “A proposta não é cobrar dos ricos, e sim, da classe média que vem tendo seus rendimentos achatados, devorados pela inflação, e empobrece cada vez mais desde o golpe de 2016”.

Como disse o Sérgio Nobre [presidente nacional da CUT] no ato de 1º de Maio, “derrobar Bolsonaro nas eleições de outubro deste ano é fundamental para ressuscitar o Brasil”, recorda Ariovaldo Camargo.

O documento dos militares por um país para eles

O argumento do documento elaborado pelos militares é, segundo eles, o de “entregar um Brasil melhor aos nossos filhos e netos”. O projeto foi coordenado pelo general Luiz Eduardo Rocha Paiva, ex-presidente do grupo Terrorismo Nunca Mais (Ternuma), a ONG do coronel e torturador condenado por crimes na ditadura militar Carlos Alberto Brilhante Ustra, que afirma que o texto é “apartidário, aberto e flexível”, segundo o repórter Marcelo Godoy, do Estadão, que divulgou o conteúdo.

Em resumo, a ideia dos militares, categoria mais privilegiada desde janeiro de 2019, inclusive com acréscimo de mais de R$ 350 mil nos rendimentos, é manter Bolsonaro no poder nos próximos 13 anos ou eleger outro presidente de extrema direita para tirar do papel as ideias perversas que elaboraram.

Além de cobrar pelo atendimento no SUS e pela unversidade pública, o texto dos militares sugere que, a partir de 2025, “o Poder Público passe a cobrar indenizações pelos serviços prestados, exclusivamente das pessoas cuja renda familiar for maior do que três salários mínimos”. O mínimo hoje é de R$ 1.212, se a medida estivesse em vigor, quem ganha um pouco a mais de R$ 3.636 já pagaria as tais indenizações propostas pelos militares

O texto também critica o dominio de esquerdidas nas salas de aula e promete resolver tudo até 2035, quando os debates políticos e ideológicos serão equilibrados, com abertura para diferentes correntes de pensamento.

Quem é Villas Bôas?

O hoje general da reserva Eduardo Villas Bôas, que está na cadeira de rodas na foto que ilustra este texto, comandou o Exército de 2014 a 2019 e trabalhou muito para eleger Bolsonaro, inclusive pressionando para manter o ex-presidente Lula, que liderava as pesquisas de intenções de voto em 2018, preso.

Na véspera de o Supremo Tribunal Federal (STF) julgar um Habeas Corpus do ex-presidente Lula (PT), ele postou um tuite pressionando os ministros. Só três anos depois, o STF anulou todas as ações do ex-juiz Sérgio Moro contra Lula. Os ministros consideraram Moro suspeito.

E em entrevista a Folha de S. Paulo deu a entender que pretendia "intervir" caso o Supremo Tribunal Federal concedesse Habeas Corpus ao ex-presidente Lula, em abril deste ano.

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IGREJA NO BRASIL O QUE É HOJE?

PASTORES USAM BÍBLIA PARA DEFENDER POSSE DE ARMAS DE FOTO NO BRASIL

 Milton Ribeiro

Líderes evangélicos postam conteúdo pró-armas. Na segunda (25), o pastor Milton Ribeiro, ex-ministro da Educação, atirou por acidente em aeroporto e feriu uma pessoa


Bárbara Poerner, Bruno Fonseca, Mariama Correia
Autodefesa e proteção da família são argumentos usados pelos pró-armas 

Influenciadores cristãos defendem armamentos entre jovens 
Voto de parlamentares evangélicos foi decisivo na aprovação de PL que flexibiliza acesso a armas 

“Se for para defender minha família, meus filhos, minha mulher, ou minha própria integridade, havendo risco, eu atiro pra matar mesmo”. A fala de Augustus Nicodemus, vice-presidente da Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB)  — entidade que representa a denominação —, foi feita durante uma conferência para jovens evangélicos em 2018, que debateu o direito de cristãos usarem armas. Presbiteriano, assim como o pastor e ex-ministro da Educação Milton Ribeiro, que entrou armado no aeroporto de Brasília, no dia 25 de abril, e feriu uma funcionária da companhia aérea Gol depois de disparar acidentalmente, Augustus é um dos pastores evangélicos que defendem o uso de armas de fogo usando argumentos bíblicos. 

Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Arma de Milton Ribeiro disparou acidentalmente no aeroporto de Brasília na última segunda-feira (25)

Trechos do Antigo e do Novo Testamento da Bíblia fundamentam discursos de pastores que defendem o porte de armas e o uso delas para a autodefesa. “A Bíblia não é contra o filho de Deus portar armas, porém tem limites. O texto está em um contexto de proteção da propriedade”, diz, citando versículos do livro de Êxodo, o pastor Leandro Quadros. Ele é apresentador de programas na Rede Novo Tempo, conglomerado de mídia pertencente à Igreja Adventista do Sétimo Dia. No mesmo vídeo postado no YouTube, Leandro afirma que, um princípio norteador da sua religião é que “o cristão é pacifista”.

Leandro também tem vídeos onde fala contra partidos de esquerda, Marxismo e a favor do presidente Jair Bolsonaro, defensor do armamento de civis. Em 2019, Bolsonaro defendeu a pauta durante participação na Marcha Para Jesus, ao lado dos idealizadores do evento, o pastor Estevam Hernandes e a bispa Sônia Hernandes, da Igreja Renascer. Enquanto Sônia discursava a favor do chefe de estado, o atual presidente encenou  o símbolo de uma arma com as mãos. 

Reprodução YouTube

Presidente Jair Bolsonaro ao lado de pastores na Marcha Para Jesus de 2019

Ainda na Marcha, Bolsonaro posou em fotos ao lado de Valdemiro Santiago, fundador da Igreja Mundial do Poder de Deus, criada após a ruptura do pastor com a Igreja Universal do Reino de Deus. Valdemiro foi preso por porte ilegal de armas em 2003.

Armas ungidas para proteção de cristãos

Em março deste ano, as armas de fogo do delegado Tito Barichello foram ungidas na Igreja Agnus, na cidade de Curitiba. Na ocasião, o pastor Renê Arian fez uma oração: “Senhor Deus, em nome de Jesus, nós ungimos essas armas para a segurança da população de nossa cidade”.  O vídeo viralizou no Instagram do delegado Tito.


Autodefesa e proteção da família são argumentos usados pelos pró-armas

Viviane Costa, pesquisadora de religião e segurança, explica que o discurso pró-armas entre as lideranças evangélicas nasce de uma “urgência de autodefesa que se estabelece pela falta de segurança pública”. “O pensamento religioso que defende essa estrutura armamentista está ligada a essa percepção da ausência de segurança da vida e da família e também passa por uma questão da manutenção do domínio religioso, uma violência que sempre esteve no discurso e que agora tem seu sentido ressignificado”

O casal formado por Clarissa Tércio, deputada estadual pelo PSC em Pernambuco, e Júnior Tércio, vereador no Recife, já postou foto com armas na mão em um clube de tiros. Bolsonaristas, eles defendem o porte de armas para a população. Sobre a repercussão da foto no clube de tiro, Clarissa afirmou que “o homem tem que ter todos os instrumentos para proteger a sua família.”

“O homem tem que ter todos os instrumentos para proteger a sua família”, afirma deputada estadual

Clubes de tiro também são frequentados por comitivas das igrejas. Em outubro de 2021, o Clube Defender anunciou uma campanha de apoio à igreja Batista Nova Esperança, na Penha, no Rio de Janeiro. O SK Clube de Tiro, no Paraná, registrou no Facebook a visita de membros da Igreja do Evangelho Quadrangular numa espécie de atividade recreativa, na qual os alvos foram substituídos por imagens de “zumbis e criaturas estranhas”.

O discurso pró-armamento também está na fala de influenciadores cristãos que produzem conteúdo para públicos jovens nas mídias sociais. Luiz Senna, de 16 anos, faz parte do grupo “O Retiro”, criado pelo pastor Guilherme Batista e que reúne 40 influenciadores cristãos. Eles foram recebidos pelo presidente Bolsonaro no Planalto, no dia 21 de março. Luiz publicou uma foto no seu perfil do Instagram, onde tem mais de 200 mil seguidores, ao lado de Ingred da Silveira. Ambos somam mais de um milhão de seguidores no TikTok. Na imagem, eles seguram armas de fogo. “Cristão é um pacificador, mas não é um pacifista que acredita que se defender com uma arma é errado. Um filho de Deus tem o dever de amar e o direito de proteger sua vida e a sua família”, diz a legenda. 

Frente Evangélica bancou aprovação do PL das armas na Câmara

A agenda pró-armamento está longe de ser uma unanimidade entre os evangélicos brasileiros, explica o pesquisador visitante de religião e direito do ISER (Instituto de Estudos da Religião), João Luiz Moura. “O campo evangélico é constituído de múltiplas formas e interpretações. Há igrejas, coletivos e atores que reconhecem que a espiral de violência deve ser interrompida não com uma declaração de objetivos, mas com um esforço coletivo de empreender alternativas e demandas sociais que confrontam as políticas pensadas a partir da violência.”

Nos discursos dos membros da bancada evangélica do Congresso Nacional há políticos que se posicionam claramente favoráveis à flexibilização do porte de armas, outros, não. Contudo, segundo a Agência Pública apurou, os deputados da Frente Parlamentar Evangélica apoiaram em sua maioria um dos principais projetos que buscam flexibilizar o acesso a armas e alterar o estatuto do desarmamento: o PL 3.723/2019, que foi aprovado na Câmara e agora tramita no Senado.

Segundo levantamento da reportagem, 112 deputados da Frente Parlamentar Evangélica (FPE) votaram sim no Plenário da Câmara, no início de novembro de 2019 — os votos desse grupo foram quase metade de todos os votos pela aprovação do projeto. Houve apenas 28 votos contrários dentre os membros da Frente, e uma abstenção. Se aprovado, o PL 3.723/2019 pode dar porte de arma municiada e pronta para uso (isto é, com cartuchos com as “balas”) a mais de meio milhão de colecionadores, atiradores esportivos e caçadores (CACs) registrados no Brasil, de acordo com dados de janeiro deste ano. 

Dentre os declaradamente favoráveis, está o caso de Abílio Santana (PSC-BA), que votou pela aprovação do PL na Câmara. Membro da mesa diretora da FPE e pastor da Assembleia de Deus Madureira, ele é filiado ao Clube de Tiro Sisaleiro, na Bahia, desde 2020. Um ano antes, em 2019, o parlamentar falou sobre o PL 3.723/2019 em vídeo publicado no YouTube: “Como você vai se defender de armas, se você não vai estar provido de uma arma? […] Quem conhece a história sabe que foi uma jogada da esquerda desarmar o cidadão.”

Outro apoiador da agenda armamentista, também membro da mesa diretora da FPE, é o deputado e pastor da Assembleia de Deus no Rio de Janeiro, Otoni de Paula (MDB-RJ) — que também votou pela aprovação do PL 3.723/2019. Em discurso no plenário em 2019, ele afirmou que “Se o cidadão quiser estar armado dentro da sua casa, ter a posse de arma, eu também sou favorável a isso, porque cada um tem direito à legítima defesa. Contudo, isso não vai resolver os nossos problemas. Ou cuidamos da geração que vai assumir o nosso lugar, ou repetiremos amanhã os mesmos problemas de hoje.”. Na última sexta-feira, 22/04, Otoni foi indicado a vice-líder do governo na Câmara, por Jair Bolsonaro.

Câmara dos Deputados

Para Otoni de Paula, “cada um tem direito à legítima defesa”

Já o atual presidente da FPE, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), afirmou que é “preciso chegar em um meio termo”, embora tenha votado a favor do PL 3.723/2019. Em entrevista ao jornal O Globo, o membro da Assembleia de Deus Vitória em Cristo disse que avalia ​​”que não temos uma cultura que permita armar a população como nos EUA, onde o acesso é muito fácil. Temos regiões do país com índice muito alto de brigas de trânsito, de violência doméstica. Imagina essas pessoas com armas? Por outro lado, não sou um desarmamentista”. Em outra ocasião, ele se mostrou favorável à posse, não ao porte. Entre seus projetos de lei propostos nesta legislatura, está o PL 2014/2021, que propõe a garantia de porte de armas aos fiscais ambientais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).


Secretaria da Cultura aprovou livro sobre história das armas no Brasil pela Lei Rouanet

Produção do livro, que tem previsão para ser distribuído no Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas, foi patrocinado pela Taurus, a maior empresa de armas leves do país

Secretário de fomento à cultura promete R$ 1 bilhão da Lei Rouanet para conteúdo pró-armas

Ao lado do ex-secretário Mário Frias, o então número dois da pasta, André Porciuncula, pediu que armamentistas usem recursos da Lei Rouanet para conteúdos audiovisuais pró-armas

Também membro da diretoria da FPE, o Pastor Eurico (PL-PE), foi relator do PL 1.256/2021, que cria um documento único de porte de arma, com validade de cinco anos, que poderá atestar a capacidade de qualquer cidadão para porte de arma de sua posse, desde que ela tenha sido cadastrada e adquirida legalmente. O deputado afirmou que a diretriz atual, que não permite o porte de armas diversas, “é absolutamente ilógica”. “O cidadão que detém o porte de arma de fogo comprovou as qualificações técnica e psicológica e atendeu aos demais requisitos legais”, disse. Ele também já participou de uma visita à empresa de armas Taurus, em 2012. O deputado, contudo, votou contra a aprovação do PL 3.723/2019.

Liderança evangélica destacada no país, o fundador da igreja Sara Nossa Terra e ex-deputado federal, bispo Robson Rodovalho, já se posicionou a favor do armamento em entrevista ao jornal O Globo. Segundo ele, “no campo das armas, muitos evangélicos são a favor da posse. Há uma sensação generalizada da impotência do Estado no campo da segurança pública“, mas em outra ocasião, afirmou que “o porte [de armas] é desnecessário.” 

Já Silas Malafaia, presidente da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, que nunca teve mandato, mas tem atuação política marcante, já comentou em seu canal no YouTube, em 2015, que a revisão do Estatuto do Armamento era um “lobby da indústria de armas”. “Nós somos a favor que a polícia esteja muito bem preparada de armamento, agora, há uma diferença entre a polícia estar bem armada e armar o cidadão. Isso é loucura!”, disse o pastor.

A reportagem tentou contato com a Igreja Presbiteriana no Brasil, mas não obteve resposta até a publicação da reportagem. Também tentamos entrevista com o Clarissa e Junior Tércio, porém não tivemos retorno da Assessoria de Imprensa. Os deputados da Frente Parlamentar Evangélica no Congresso também foram procurados, mas não responderam nossos questionamentos.

           link apublica.org.                            
                        
                                          

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PARTICIPAÇÃO SOCIAL

STF derruba decreto de Bolsonaro que excluiu participação social nas políticas ambientais

Com 9 x 1, Corte tem maioria contra retirada de integrantes do FNMA; Barroso e Fachin veem conduta antidemocrática
Murilo Pajolla

Brasil de Fato | Lábrea (AM)


O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta quarta-feira (7) para derrubar um decreto federal que reduziu a participação social no conselho do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNDA).

O julgamento faz parte da "pauta verde", que reúne ações judiciais contrárias a medidas de Jair Bolsonaro (PL) na área ambiental. A sessão será retomada nesta quinta-feira (28), com o voto do presidente da Corte, Luiz Fux.

A ação analisada nesta quarta (27) foi protocolada pela Rede Sustentabilidade e já tem nove manifestações favoráveis, entre 11 ministros. O voto divergente é do ministro Kassio Nunes Marques, indicado por Bolsonaro ao Supremo.

No âmbito da mesma ação, os ministros também concederam a derrubada de dois decretos que alteraram o funcionamento do Fundo Amazônia e do Conselho Nacional da Amazônia Legal (CNAL).

Por determinação do governo, esses órgãos abriram mão da participação de ONGs, pesquisadores, movimentos sociais, prefeitos e governadores na elaboração de políticas públicas.

Barroso responsabiliza Bolsonaro

“A coletividade é agente de proteção do direito intergeracional ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e não pode ser alijada de suas decisões. É preciso que o estado crie - e não ao contrário - ferramentas para efetiva participação”, declarou hoje o ministro Fachin.

Barroso afirmou que os decretos “interferem no direito fundamental à proteção ambiental e ao direito de participação da sociedade”. Atribuiu ainda a escalada na devastação ambiental às ações do governo Bolsonaro. “Esse é um fato objetivo, não é uma opinião”, completou.

Já para Nunes Marques, a redução da participação da sociedade civil em conselhos ambientais é uma decisão legítima do governo.

"O que foi mudada foi apenas a estrutura administrativa de um determinado conselho, o qual não tem forma definida pela lei, cabendo ao presidente da República delineá-lo por meio de decreto. A chamada vedação do retrocesso não pode petrificar certos atos normativos, tornando insuscetíveis de modificação posterior", justificou.

Decretos esvaziaram conselhos

As regras questionadas no STF entraram em vigor durante o governo Bolsonaro, que promoveu retrocessos inéditos nas políticas do setor. Como consequência, o Brasil vem batendo recordes de desmatamento nos biomas, principalmente na Amazônia.

O item da “pauta verde” em julgamento é a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 651. O partido quer anular o Decreto Presidencial 10.224/2020, que alterou a composição do Conselho Deliberativo do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA).

Criado em 1989, o FNMA é administrado pelo governo federal e financia projetos que promovem o uso racional e sustentável de recursos naturais. O Conselho Deliberativo é o responsável por selecionar os projetos.

Até 2020, o Conselho era composto por 17 representantes, nove de organizações governamentais e oito da sociedade civil. Sob Bolsonaro, o órgão passou a ser composto apenas pelo ministro do Meio Ambiente e representantes da Casa Civil, Economia, Meio, Ibama, ICMBio, além do próprio MMA.

Com a alteração, foram excluídos do Conselho: Associação Brasileira de Entidades do Meio Ambiente (Abema), Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente (Anamma), do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (FBOMS), da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e mais um representante da sociedade civil indicado pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).

Após protocolar a ação, a Rede acrescentou dois pedidos de anulação de outras duas normas que restringem o controle social sobre o meio ambiente. São elas: o decreto 10.239/2020, que afastou a participação de governadores no Conselho Nacional da Amazônia Legal (CNAL) e o Decreto 10.223/2020, que extinguiu o Comitê Orientador do Fundo Amazônia.

Edição: Rodrigo Durão Coelho

BRASIL DE FATO
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Castro Rocha:

'BOLSONARISMO ESTÁ SE TRANSFORMANDO EM SEITA'

Autor de livro sobre a retórica do ódio afirma que a guerra cultural dos bolsonaristas se aproxima do fundamentalismo: 'É uma fábrica de inimigos em série'

Bertha Maakaroun

João Cezar de Castro Rocha, autor do livro 'Guerra cultural e retórica do ódio - Crônicas de um Brasil pós-político'(foto: Rogerio B. Huss/Flip)

Para o professor João Cezar Castro Rocha, o governo Bolsonaro é uma fábrica de produção de inimigos em série, que alimenta uma guerra cultural calcada em fatos alternativos, inteiramente movida no universo digital, com diferentes narrativas focadas em perfis específicos.

A imersão em tal realidade paralela, que atrai milícias digitais treinadas em retóricas de ódio e desqualificação do outro, destinadas a questionar os fatos da realidade, tem o seu preço. “Para o bolsonarismo, é impossível a simples noção de um problema concreto, porque qualquer aspecto da realidade é encoberto pela guerra cultural. Isso cria um problema sério, que estamos vivendo agora, que é o colapso completo da gestão pública, é uma crise sanitária e humanitária sem proporções, é a maior tragédia da história brasileira que poderia ter sido evitada se tivéssemos um governo, mas precisamente não temos um governo, porque temos bolsonarismo demais”, avalia Castro Rocha, ensaísta e pesquisador da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), titular de literatura comparada e autor do livro “Guerra cultural e retórica do ódio – Crônicas de um Brasil pós-político” (Editora Caminhos).

Em consequência da guerra cultural e falta de gestão, o golpe – o autogolpe – fantasma que rondou a história republicana brasileira e parecia enterrado após a redemocratização –, volta a assombrar o país. “Uma vez que não há possibilidade de existir como governo – porque não há política pública, pois em lugar de considerar dados objetivos busca inimigos e se aferra à guerra cultural –, a única forma de manter o poder é o golpe. Não há outra forma possível, porque o golpe é objetivo verdadeiro da guerra cultural”, assinala o autor.

Em nova hipótese de pesquisa, João Cezar Castro Rocha sustenta: “A guerra cultural bolsonarista deu um passo além. Deixou de ser apenas um instrumento para a disputa de narrativas e para vencer campanhas eleitorais. É mais do que isso hoje. Está se transformando em uma seita, numa forma de vida”. É assim que, em vez de apenas contestar os fatos da realidade, o bolsonarismo salta da realidade virtual para o mundo real, sem máscaras, com overdoses de ivermectina e marchas em continência à caixa de cloroquina, como ocorreu em São Lourenço, no Rio Grande do Sul.

Mirando no desfecho do governo de Donald Trump, nos Estados Unidos, o pesquisador projeta: “A minha expectativa é de que o governo Bolsonaro seja atropelado pela realidade, pelos fatos concretos. A pandemia acelerou a desintegração do inevitável, do governo que não há, que é o governo Bolsonaro, porque há bolsonarismo demais.” A seguir, uma entrevista com o ensaísta.

Em seu livro, o senhor sustenta que, embora a guerra cultural seja o eixo do governo Bolsonaro e precisamente aquilo que explica o êxito do bolsonarismo, é também a razão do colapso administrativo do governo federal. Como se explica o paradoxo?

A guerra cultural é precisamente a divisão do mundo entre, por um lado, os “meus” – os que me são próximos – a quem eu defendo porque acredito que possuo a essência, a verdade absoluta do mundo; e, por outro lado, estão todas as pessoas que percebo não como adversárias que pensam legitimamente de forma diferente da minha, mas que são inimigas que encarnam o mal. Infelizmente, a minha hipótese foi perfeitamente confirmada na atual tragédia em que vivemos.

Estamos falando hoje em um dia (30 de março) em que o Brasil bateu um recorde absoluto em toda a sua história de número de mortes em 24 horas. Foram 3.780 notificações, e talvez o número seja ainda maior. Se tivéssemos tido um planejamento sensato para a compra de vacinas, esse número seria muito inferior. Mas o que faz o presidente Bolsonaro? Ele troca o ministro da Defesa, convoca um jejum para a população cristã e a base bolsonarista utiliza uma tragédia – a morte de um PM na Bahia – para tentar incitar as polícias militares de todo o país contra governadores que praticam medidas para conter a disseminação do vírus.

Portanto, a guerra cultural bolsonarista tem um caráter fundamentalista. E, no momento em que a pandemia está fora de controle, não dispomos de vacina, convocar um jejum e a necessidade de encontrar inimigos o tempo todo, agora são governadores e prefeitos, mas já foi o STF, já foi o Congresso, entre outros. É mais uma demonstração concreta da guerra cultural.

Como essa fábrica de inimigos se relaciona com a fábrica de fatos alternativos, uma percepção distorcida da realidade?
O governo Bolsonaro é uma fábrica de invenção de inimigos em série. Só é possível fazê-lo desconsiderando dados objetivos da realidade. Porque na realidade da administração de um país não há inimigos. O que há são problemas concretos para serem resolvidos. Para o bolsonarismo, é impossível a simples noção de um problema concreto, porque qualquer aspecto da realidade é encoberto pela guerra cultural. Agora no Orçamento da União de 2021, o governo cortou 90% da destinação ao IBGE para a realização do censo.

Portanto, é mais uma vez uma demonstração eloquente do que digo. É que, para o bolsonarismo, o censo é perda de tempo. Como não vai mesmo considerar dados objetivos, para que gastar dinheiro com o censo? Agora, se não gasta dinheiro com o censo, como pode ter uma política pública razoável se não se dispõe dos dados concretos sobre os problemas que deve enfrentar? Isso cria um problema sério, que estamos vivendo agora, que é o colapso completo da gestão pública, é uma crise sanitária e humanitária sem proporções, é a maior tragédia da história brasileira que poderia ter sido evitada se tivéssemos um governo, mas precisamente não temos um governo, porque temos bolsonarismo demais. Isso tem uma consequência terrível, que enfrentamos agora: estamos neste momento, como diria um autor mineiro (Guimarães Rosa), com “o diabo na rua, no meio do redemoinho”.

Qual é o desfecho mais provável para um governo com as características que o Sr. descreve, ou seja, que não considera dados objetivos da realidade para a gestão, de modo que consegue existir enquanto governo?
Uma vez que não há possibilidade de existir como governo – porque não há política pública, pois, em lugar de considerar dados objetivos, busca inimigos e se aferra à guerra cultural –, a única forma de manter o poder é o golpe. Não há outra forma possível, porque o golpe é o objetivo verdadeiro da guerra cultural. O golpe é o instante em que o inimigo não é mais apenas hostilizado do ponto de vista simbólico, não se trata apenas de lançar mão de uma linguagem, da retórica, a retórica do ódio propagada por Olavo de Carvalho.

O que se trata agora é de passar da retórica para a ação violenta. O golpe é necessariamente a vocação do bolsonarismo. O que precisamos fazer é fortalecer as instituições democráticas e deixar claro que, como sociedade civil, não aceitaremos mais uma ditadura no país. Mas hoje temos uma situação particularmente complexa.

O fantasma do golpe, que parecia enterrado após a ruptura institucional com o golpe de 1964, volta a rondar o Planalto?
Uma vez que o bolsonarismo não permite que haja governo, o colapso é inevitável. É assim e sempre será. Venho dizendo isso desde março do ano passado e, por isso, escrevi o livro. Já houve no governo Bolsonaro a tentativa de autogolpe em maio de 2020, que eu analiso minuciosamente no livro. E isso será sempre assim.

O que a memória histórica da República brasileira ensina sobre os autogolpes?

Infelizmente, não temos memória histórica, não conseguimos projetar o presente no diapasão mais amplo. O autogolpe é a forma básica do militarismo brasileiro. Floriano Peixoto deu uma espécie de autogolpe e se atribuiu poderes autocráticos que lhe permitiram eliminar fisicamente os seus adversários. “Triste fim de Policarpo Quaresma”, de Lima Barreto, se passa durante o período de Floriano Peixoto. E se chama “Triste fim” porque na última cena do romance fica claro que Policarpo Quaresma será executado pelas tropas florianistas por ser um adversário do regime.

Arthur Bernardes governou durante quatro anos – de 1922 a 1926 – com estado de sítio. O presidente seguinte, Washington Luís, dizia que a questão social era questão de polícia. Após a Revolução de 1930, Getúlio Vargas no poder, em 1937 deu um autogolpe, o do Estado Novo, uma terrível ditadura. O Jânio Quadros, quando renunciou em 1961, tinha por propósito dar um autogolpe. Seguia o exemplo de Charles de Gaulle, na França, que havia renunciado e só aceitou voltar com poderes autocráticos. A ditadura militar que deu o golpe em 1964, em 1968 com o AI-5 deu um autogolpe, porque alijou a chamada linha moderada. Em 1969, quando Arthur da Costa e Silva teve um AVC e faleceu, quem deveria ter assumido era o vice-presidente civil, Pedro Aleixo.

Mas ele foi alijado da sucessão, porque foi o único membro do governo que não assinou o AI-5. Então, houve outro autogolpe, assumiu uma Junta Governativa, os ministros das pastas militares, até passarem o poder para Garrastazu Medici. Em 1977, o general Sylvio Frota, ministro do Exército, tentou dar golpe em Ernesto Geisel. Quem foi o jovem capitão que auxiliou Sylvio Frota na tentativa do golpe contra Geisel? Chama-se Augusto Heleno. O autogolpe é traço característico da história da República brasileira

Como o bolsonarismo forma opinião e se posiciona em relação aos temas da atualidade?

Há um paradoxo muito importante e a razão para escrever o livro. Do ponto de vista da produção de fatos alternativos, notícias de mentira, articuladas em narrativas, o bolsonarismo não tem rival possível na política brasileira. É preciso reconhecê-lo. São profissionais. Fazem isso 24 horas por dia. Descobri na minha pesquisa recente, que ainda não está no livro, e nesse sentido é uma hipótese nova. Começamos pela constatação: o bolsonarismo possui uma midiosfera própria, que é composta pelas correntes de WhatsApp, mas possui também rede integrada de canais de YouTube e aplicativos.

Um em particular, chamado Mano, reúne um número enorme de canais de televisão e estações de rádio disponibilizados gratuitamente para todos. Mas, quando entra em qualquer rádio ou televisão, primeiro é conduzido para a caixa de diálogo, como um chat, e nessa caixa de diálogo é o truque: os conteúdos são sempre bolsonaristas e são sempre muito fortes. Nas cidades do Rio e Curitiba, quando houve a pandemia e decidiram fazer o ensino através de estações de televisão, o governador do Paraná, Ratinho Júnior, e o então prefeito do Rio Marcelo Crivella decidiram, ‘coincidentemente’, utilizar o aplicativo Mano para os alunos da rede pública.

Isso quer dizer que essas pessoas que parecem paranoicas, que vieram de outro planeta, porque sempre se saem com narrativas articuladas, mas evidentemente conspiratórias e falsas, recebem 24 horas por dia informações produzidas especialmente para elas. São vídeos e materiais muito elaborados e de impacto. E hoje, no Brasil, temos situação particularmente grave, porque uma estação de rádio, a Jovem Pan, e uma televisão, a Rede TV, têm servido para fortalecer as teorias conspi- ratórias. As teorias conspiratórias se iniciam nos canais de YouTube e de WhatsApp, então vão para o programa da Jovem Pan, a mesma teoria conspiratória é repetida.

Quando chega no mainstream, a teoria conspiratória retorna aos círculos bolsonaristas, agora com o aval de verdade. Isso é muito grave, porque o que acontece é que existem milhões de pessoas no Brasil bombardeadas todos os dias com informação produzida por canais de YouTube que fazem a “farsa jornalismo”, uma ofensa ao jornalismo, pois são evidentemente destinadas à difusão de teorias conspiratórias e de desinformação deliberada.

Como as pessoas que têm prevenção contra a mídia profissional que apura e veicula fatos foram cooptadas para a midiosfera bolsonarista?
Isso é parte do que chamo a retórica do ódio, ensinada por Olavo de Carvalho há duas décadas. Chamo de retórica de ódio e não discurso do ódio, porque não é uma forma qualquer de desqualificação do outro. É uma técnica ensinada. A lógica argumentativa foi ensinada. Tem pressupostos que são repetidos por todos. É como se fosse uma escola de perversão. Isso leva, creio, a uma questão grave, a hipótese nova que ainda não está no livro: precisamos de entender que a guerra cultural bolsonarista deu um passo além. Se não entendermos, não saberemos evitar o golpe.

Deixou de ser apenas um instrumento para a disputa de narrativas e para vencer campanhas eleitorais. É mais do que isso hoje. A guerra cultural bolsonarista está se transformando em uma seita, numa forma de vida. Não basta mais disputar narrativas. É preciso ostensivamente não usar máscaras, é preciso tomar overdose de ivermectina, como se as pessoas não tivessem sistema hepático. Não basta mais mentir dizendo que o STF retirou a competência do governo federal para agir na pandemia, é preciso fazer o que aconteceu em São Leopoldo (RS): perfilar diante de uma caixa gigante de cloroquina, bater continência e cantar o Hino Nacional.

Ou seja, a guerra cultural está se transformando num fundamentalismo cotidiano. Nunca houve nada semelhante na história brasileira. Se não formos capazes de compreender e de denunciar que a guerra cultural deixou de ser disputa de narrativas e passou a ser uma forma de vida – e é isso o que está por detrás do autogolpe planejado – abriremos caminho neste país para algo que não conhecemos, algo a que não estamos acostumados, que é o terrorismo doméstico.


Qual é o contexto histórico mais recente do qual o bolsonarismo se beneficia?

O bolsonarismo não é a causa da ascensão da extrema-direita no Brasil. Ele é a consequência de uma articulação de duas décadas de forças de direita no Brasil. O bolsonarismo não é a origem, foi o ponto de fuga, o beneficiário de um movimento anterior. Esse é o primeiro ponto. O segundo ponto, e em relação a este, o bolsonarismo é origem e causa: foi a primeira vez no Brasil em que, de maneira sistemática, aplicaram-se no país as estratégias desenvolvidas pelo grupo Cambrigde Analytica, idealizadas por Steve Bannon: em lugar de fazer política para o cidadão, o que Bannon inventou é fazer política para perfis de usuários nas redes sociais.

Então, a política deixa de ser uma ideia geral do bem coletivo, uma proposta para todos. A política passa a ser uma resposta automática e imediata para os anseios de nichos da população. Isabela Kalil, uma brilhante antropóloga de São Paulo, fez, em 2018, um estudo dos apoiadores de Bolsonaro: levantou 16 perfis de apoiadores. Há alguns contraditórios. Você tem o evangélico neopentecostal. Mas você tem o perfil “gay com Bolsonaro”. Como isso acontece na prática? Se colocar lado a lado, numa mesma campanha, no mesmo discurso, o neopentecostal evangélico e o “gay com Bolsonaro” não vai dar certo. Como podem ficar juntos? Na política da era digital você não faz mais campanha para os cidadãos. Não se trata mais do brasileiro cidadão.

Se tem 16 perfis de apoiadores, você produz 16 campanhas e se comparar os conteúdos das campanhas não param em pé, porque são contraditórios. Mas não importa, porque o gay com Bolsonaro não vai encontrar o fundamentalista neopentecostal. Mas eles vão votar na mesma eleição. E, quando se reúnem, a diferença que possuem é suprimida pela descoberta de um inimigo comum. Por isso, o bolsonarismo não vive sem inimigo: a base é muito heterogênea, foi construída não em cima de uma proposta para o país, mas em elementos de destruição.

Como a pandemia impactou a guerra cultural?

Eu preferia não ter escrito o livro, preferia não ter razão, preferia que Bolsonaro estivesse se revelado um estadista e que não tivéssemos hoje a tragédia que vivemos. Infelizmente, e eu anunciei isso em março de 2020, em minha análise do bolsonarismo, devido à predominância da guerra cultural, o bolsonarismo triunfa e o governo Bolsonaro fracassa. O que eu imaginava antes de a pandemia chegar é que por volta do segundo semestre de 2021 o país começaria a entrar em colapso, porque não tem administração pública, é simplesmente isso. Não tem gestão da coisa pública. Não tem censo.

As pessoas não compram vacina, não têm seringa estocada. Isso você pode reproduzir para todos os ministérios. O governo Bolsonaro não tem reunião de trabalho. Vimos aquela fatídica reunião em 22 de abril de 2020, que era reunião, não era nada, foram mais de duas horas, não houve uma única proposta razoável. Não há governo, porque há bolsonarismo demais. Então, o colapso me parecia inevitável e eu dizia, o colapso virá, e será o momento do autogolpe, porque não haverá alternativa. No governo Trump – a economia americana, embora tenha favorecido em muito os ricos, teve muito mais resultados positivos do que o governo Bolsonaro –, o presidente foi atropelado pela realidade.

Trump começou o governo como o governo dos fatos alternativos; terminou o governo como o governo cuja alternativa a ele foram os fatos. Negou a pandemia, estimulou a cloroquina, acreditou na imunidade de rebanho, quando tentou voltar atrás era tarde: há meio milhão de americanos mortos. Depois, quando negou o resultado eleitoral, que evidentemente não foi uma fraude, ele conseguiu provocar um fenômeno na história norte-americana. Tentou dar um golpe. A minha expectativa é de que o governo Bolsonaro seja atropelado pela realidade, pela concretude dos fatos. A pandemia acelerou a desintegração do inevitável, do governo que não há, que é o governo Bolsonaro, porque há bolsonarismo demais.

É possível fazer uma analogia entre o Ministério da Verdade, citado por George Orwell em “1984”, e o Brasil de Bolsonaro?

Com certeza, com uma diferença chocante. Se você se lembrar da distopia de “1984”, era uma imposição de alto a baixo. As pessoas precisavam escolher as suas emoções, não era possível amar, havia um monitor na casa das pessoas que controlava o batimento cardíaco para descobrir se havia emoções suspeitas. Mas nós vivemos uma situação muito pior. Vivemos o 1984 adotado voluntariamente. Isso é o pior de tudo. E uma outra distopia, que lemos muito mal, que é “Fahrenheit 451”, de Ray Bradbury, que só lembramos que as pessoas queimavam livros. Há um professor que diz uma frase que sempre me comoveu muito.

Ele diz para um bombeiro que decide deixar de queimar livros para lê-los: o Estado não começou a queimar livros. Foram as pessoas que deles se desinteressaram. E só por isso eles puderam ser queimados. E, na casa de cada pessoa, em lugar de livros, foi colocada uma grande tela, que não vigiava, porque vigia é muito óbvio. Mas entretinha as pessoas 24 horas, ou seja, as anestesiava. No caso brasileiro, o que é mais sério, é que vivemos um 1984 em que as pessoas voluntariamente aceitaram um big brother; no caso, um “mito”.

Ao apresentar carta de demissão, Ernesto Araújo afirmou que foi vítima de "uma narrativa falsa e hipócrita a serviço de interesses escusos nacionais e estrangeiros". Por que ele faz questão de usar a palavra ‘narrativa’?

Há uma perversão completa no uso dessa palavra. Como um resultado da revolução da contracultura nos anos 60 e como resultado da chamada teoria crítica, que questiona o próprio objeto, não toma o objeto como dado da natureza, um conceito que foi surgindo e nos anos 80 ganhou completo domínio, com dois autores – Jean Baudrillard (“Simulacros e simulação”) e Jean-François Lyotard (“A condição pós-moderna”) – com a ideia de que a pós-modernidade recusava a grande narrativa da modernidade, que sempre era teológica e tudo explicava.

Num primeiro momento, a ideia de que a realidade dura, de que os fatos eram opressões do sistema, foram ideias adotadas no sentido libertador. A genialidade do mal, do Steve Bannon, adotada por Olavo de Carvalho, e, portanto, pelos bolsonaristas, é que tomaram essa mesma ideia, e viraram-na pelo avesso. Se, num primeiro questionamento da realidade como núcleo duro e do fato como algo incontestável, poderia ser política de esquerda, porque liberava sentidos e criava uma complexidade em lugar da homogeneidade, o que aconteceu é que a extrema-direita se apropriou dessas ideias. Se só há narrativas e não há fatos, o que o bolsonarista faz: “Você tem certeza de que morreram ontem 3.780 pessoas?”.

Quando o interlocutor responde que são as estatísticas, o bolsonarista continua: “Quais são as fontes? Você por acaso verificou pessoalmente? Por acaso você sabe o CPF das 3.780 pessoas? Por acaso foi feita autópsia nessas pessoas, viu se o hospital está cheio?”. Então, a extrema- direita se apropriou de maneira perversa de uma reflexão que buscava apostar na pluralidade e na multiplicidade de sentidos possíveis e por isso recusava o império do fato e a ideia da realidade como algo incontestável, para, na verdade, utilizar isso para impor o oposto: uma visão única, maniqueísta e binária.

Qual é o projeto de Jair Bolsonaro com a sua guerra cultural?

No discurso, um Estado totalitário teocrático, em que a família terá acesso a todo o dinheiro do mundo. Não há projeto de país, não tem governo. Mas a tarefa para a resistência é abrir canal de diálogo com eleitores eventuais de Bolsonaro e com a comunidade evangélica. Ou fazemos isso ou, em 10 anos, talvez este país não seja habitável. A crise da pandemia deixa claro que não se pode governar com guerra cultural. Vai faltar kit intubação, vai faltar anestesia, uma tortura medieval. Vai ser isso ou morrer sem ar. Fatos objetivos: o governo gastou R$ 250 milhões para distribuir o kit cloroquina em todas as unidades da Federação.

A dose da AstraZeneca custa 2,5 euros. Isso quer dizer que, com o kit cloroquina, o governo jogou fora entre 13 milhões e 15 milhões de doses de vacina. Não adianta disputar narrativa. É a falência total da administração pública. Esse modelo de administração no país, fundamentalista, sectário, com base na guerra cultural, levará ao colapso absoluto.

O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta declarou recentemente em entrevista ao Estado de Minas: “O Brasil, hoje, é administrado pela internet e por pessoas que não fazem parte do governo. O Brasil está sendo administrado pelo algoritmo”. Como avalia essa afirmação?
Concordo, é isso mesmo. E há um limite. É que o algoritmo funciona muito bem porque visa sempre à produção de curtidas no espaço virtual. A transferência automática desse modelo para a realidade tem uma dificuldade real, que é a própria realidade. Na circunstância de uma tragédia como uma pandemia, a ineficiência desse modelo vem à tona.

Em quais outros momentos da história brasileira foi empregada a guerra cultural, em voga no governo Bolsonaro?

Ela já ocorreu em alguns momentos de forma bastante aguda. Sobretudo entre 1961 e 1964, e houve inclusive institutos de direita, como o Instituto de Políticas e Estudos e Sociais (Ipes), e o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (Ibad), responsáveis por desestabilizar o governo João Goulart. Esse tipo de guerra cultural já aconteceu no Brasil. Uma das coisas que faço no livro é reconstruir essa história. Nesse período, a polarização foi ainda mais forte do que agora, muitos empresários financiaram o golpe e também capital americano. Durante três anos, houve vários institutos de produção cultural como o Ipes – que teve como presidente o general Golbery do Couto e Silva e um dos financiadores Walter Moreira Salles, cujo objetivo era produzir material anticomunista para desestabilizar o governo João Goulart. E conseguiram. Já houve antes. Mas qual é a novidade agora?

É o universo digital. O bolsonarismo inaugurou uma nova forma de fazer política no Brasil, pela maestria com que domina o meio digital. Além disso, há um contexto. Um efeito colateral de o PT ter governado entre 2002 e 2016 não foi compreendido pela esquerda: houve uma geração que cresceu com um partido de esquerda no poder, para a qual, pela primeira vez, foi possível, para ser de oposição, ser de direita. Para ser revolucionário, ser conservador, porque quem estava no poder era o PT. Essa geração é uma novidade absoluta na política brasileira. É coisa incompreensível uma juventude de direita. Mas se um partido de esquerda ganha quatro eleições, tem uma defasagem temporal de jovens que dominam as redes sociais, são bilíngues, falam português e internetês como línguas nativas.

São jovens de direita porque são rebeldes, num momento em que um partido de esquerda está no poder. Esse fenômeno, que foi absolutamente decisivo, é anterior ao bolsonarismo. É outra razão pela qual não podemos atribuir ao bolsonarismo a causa completa da situação atual. Em boa medida, o bolsonarismo foi tributário. Então, há dois momentos de guerra cultural: primeiro, entre 1961 e 1964. Segundo, a partir de 2002, há uma juventude de direita, aguerrida, produtiva, irreverente, que domina as redes sociais e, no Brasil, quem primeiro produziu memes de qualidade foi a direita. E essa guerra cultural a partir de 2002 tem um tema: para a juventude, ser de oposição é ser de direita e há um conceito, que é um mantra, sem o qual não se entende a chegada de Bolsonaro ao poder.

É o conceito de hegemonia cultural da esquerda. Para esses jovens de direita, o conceito é verdadeiro e eles se unem para combater uma hegemonia. Eles consideram que existe, ainda que não exista, e passe a existir como efeito prático. Mesmo a guerra cultural bolsonarista não é uma novidade absoluta, ela é o acúmulo de energia. O bolsonarismo é o acúmulo de energia da reorganização da direita, com uma novidade, que é radical: a utilização absolutamente profissional das possibilidades criadas para o campo da política e dos relacionamentos humanos, do universo digital.

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