CRIANÇA BRASILEIRA DE 8 ANOS TEM DEDOS DECEPADOS DURANTE SESSÃO DE BULLYNG EM ESCOLA DE PORTUGAL


Menino brasileiro de 9 anos sofria bullying e já havia sido vítima de outras agressões na escola, mas a instituição de ensino sempre minimizava. “A primeira funcionária que encontrou meu filho passou mal”, relatou a mãe. “Vim para Portugal buscar uma vida melhor, mas agora estou com medo [...] meu filho tem crises de choro e pergunta se alguém vai ser punido”



Por Ana Oliveira e Felipe Borges

O que deveria ser uma manhã comum de aula em Cinfães, distrito de Viseu, terminou em tragédia para o menino brasileiro José Lucas, de nove anos. Dois dedos da criança foram amputados depois que colegas fecharam uma porta sobre sua mão dentro do banheiro da Escola Básica de Fonte Coberta. A mãe, Nívia Estevam, 27 anos, afirma que o filho vinha sendo alvo de agressões desde o início do ano letivo — e que a escola tratou o ataque brutal como uma simples “brincadeira”.

A Direção do Agrupamento de Escolas de Souselo abriu uma investigação interna, mas a família denuncia negligência, racismo e falta de assistência por parte das autoridades.
Um ataque que poderia ter sido evitado

Segundo Nívia, o episódio ocorreu na última segunda-feira (10). José Lucas havia acabado de entrar no banheiro quando dois colegas o seguiram e empurraram a porta contra seus dedos, pressionando até amputá-los. O menino tentou abrir a porta, mas a dor o impediu. Ele precisou se arrastar para pedir ajuda.

A primeira funcionária que o encontrou passou mal ao ver a cena. A segunda se limitou a perguntar ao menino: “Por que eu vim mais cedo para a escola?”

Quando telefonou para a mãe, a professora responsável pela turma, Sara Costa, disse apenas que o menino “estava brincando” e “amassou o dedo na porta” — omitindo a violência e a gravidade do ferimento. Ao fundo da ligação, porém, Nívia ouviu alguém pedir que chamassem uma ambulância. Ela correu para a escola, que fica a poucos minutos de casa, sem ser informada de que o filho havia perdido parte dos dedos.

Ao chegar, foi conduzida aos fundos do prédio. Encontrou José Lucas desesperado, com a mão enfaixada e uma atadura na boca para suportar a dor.
Demora no socorro e protocolo rígido

Registrado em Portugal, o protocolo local determina que o ferido entre sozinho na ambulância, para evitar que familiares desmaiem ou atrapalhem o atendimento. O serviço de emergência levou entre 30 e 40 minutos para chegar, segundo a mãe.

A escola entregou aos paramédicos apenas um dos pedaços amputados. Durante o trajeto ao hospital, um bombeiro orientou Nívia a carregar, dentro de uma luva, partes dos dedos do filho — sem saber quantos exatamente, porque “não quiseram mexer”.

No hospital, José Lucas passou por uma cirurgia de três horas. Não foi possível reimplantar os dedos. Parte do material amputado foi usada para cobrir a região exposta.

“O dedo maior ficará sem unha, e o indicador ficará com apenas metade”, relatou a mãe.

‘Mãe, aquela escola não é para o seu filho’

O hospital acionou a Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ), que abriu investigação. A assistente social orientou Nívia a retirar o menino da escola e, se possível, mudar de cidade.

“Eles continuam afirmando que aquilo foi uma brincadeira. Se puder mudar de escola e de cidade, faça isso”, disse a profissional à família.

No dia seguinte, Nívia procurou a polícia. Ouviu que se tratava de um “acidente”, conforme versão apresentada pela escola. Na segurança social, recebeu a informação de que o atendimento poderia levar até seis meses.


O caso só ganhou repercussão quando, na madrugada de quarta para quinta, Nívia decidiu escrever um relato em uma página de televisão em Portugal. Depois, reativou o próprio Instagram para denunciar o ocorrido.

Mesmo assim, ela afirma estar com medo. Mudou de distrito e foi morar com os sogros.

“Eu vim para Portugal buscar uma vida melhor. Agora tenho que recomeçar do zero de novo”, disse. Nívia é de Belém (PA) e vive no país há sete anos.

Racismo, xenofobia e histórico de agressões

A mãe afirma que o ataque teve componente discriminatório. Segundo ela, José Lucas era alvo de violência por ser brasileiro, preto, gordo e recém-chegado à escola.

Antes da amputação, o menino já havia aparecido em casa com veias estouradas no pescoço. “Prenderam meu filho contra a parede e estouraram as veias, deixando marcas roxas”, contou. Também havia relatos de puxões de cabelo, pontapés e tentativas de enforcamento.

A família comunicou a professora, enviou mensagens, cobrou providências. Nada foi feito. Mesmo depois da mutilação, a escola insistiu na versão de que tudo não passara de uma “brincadeira entre crianças”.

Investigação interna e silêncio oficial

Em nota, o Agrupamento de Escolas de Souselo afirma que tem conhecimento do caso e abriu uma investigação interna, “dando cumprimento à legislação em vigor”.

A família ainda não recebeu apoio da Embaixada do Brasil. Parentes tentaram contato com órgãos brasileiros, mas, segundo Nívia, “ninguém prestou assistência até agora”.
Um país que prometia acolhimento

O caso de José Lucas expõe não apenas a violência escolar, mas também o desamparo que muitas famílias brasileiras enfrentam ao buscar proteção para seus filhos no exterior. A mutilação de uma criança dentro de uma escola, somada à tentativa de minimizar o ocorrido, revela uma falha sistêmica — na mediação escolar, no atendimento emergencial, na resposta policial e na rede de proteção local.

Enquanto a investigação avança, Nívia tenta reconstruir a vida em segurança e oferecer ao filho o que a escola não ofereceu: cuidado, proteção e respeito. “Meu filho não bate em ninguém, é uma pessoa boa. Eu vou ensinar meu filho a bater?”, disse ela.

Nívia afirma que José tem crises de choro ao lembrar a violência. “Durante o dia, ele fica bem, mas à noite pergunta por que fizeram isso e quem vai pagar. Eu tento acolher, mas ainda estou digerindo tudo”.

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