ULTRAPROCESSADOS MATAM 57 MIL PESSOAS POR ANO NO BRASIL

CONGRESSO EM FOCO

por Bruna Hassan* e Paula Johns**

                                                                                      
Foto: gingerbreadca (via Pixabay)

Uma verdade indigesta. No Brasil, por ano, registram-se 57 mil mortes pelo consumo de ultraprocessados, produtos recheados de corantes, aromatizantes, edulcorantes, além de outros aditivos, com quantidades excessivas de açúcar, gordura e sódio. Cada vez mais baratos e acessíveis, artigos como refrigerantes, embutidos, salgadinhos de pacote e macarrão instantâneo estão relacionados à epidemia mundial de obesidade e ao avanço das doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) – diabetes, câncer etc., além da depressão e dos casos de declínio cognitivo.

Para tentar deter a tendência e reduzir a procura, a Organização Mundial da Saúde e o Banco Mundial recomendam sobretaxar alimentos e bebidas que fazem mal. Um recurso com objetivo de aumentar o preço final deixando as mercadorias menos atraentes para o consumidor. As experiências em países de realidades distintas, como México, Reino Unido, Canadá, África do Sul, Chile e Portugal, entre outros, comprova a efetividade da iniciativa.

No Brasil, no momento em que a reforma tributária tramita no Senado, a ação vem sendo defendida por profissionais de saúde e representantes da sociedade civil. Assim como a medida, aprovada na Câmara, instituindo a desoneração da Cesta Básica, que deveria ser composta por itens essenciais e saudáveis, como feijão, arroz, frutas e legumes.

A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 45/2019 representa, portanto, uma grande oportunidade para que a saúde da população prevaleça sobre interesses comerciais de setores específicos. Sabemos que se trata de uma disputa acirrada. Mesmo assim, causa espanto quando segmentos da indústria defendem seus lucros com argumentos calcados no obscurantismo, na negação da Ciência.

Quem insiste em agrupar na mesma categoria “alimentos processados” e “produtos alimentícios ultraprocessados” despreza um feito memorável de pesquisadores brasileiros: a classificação NOVA. Há duas décadas, em função da progressão da pandemia mundial de obesidade e de DCNTs, os alimentos passaram a ser classificados a partir da extensão e da finalidade do processamento a que são submetidos. Foram estabelecidas, então, as categorias in natura e minimamente processados, ingredientes culinários, processados e ultraprocessados.

A partir daí, os guias alimentares do Ministério da Saúde recomendam evitar ultraprocessados que, na verdade, estão mais para simulação de alimentos do que qualquer outra coisa. Da mesma forma que destacam a importância de se promover o acesso a produtos saudáveis com a redução dos seus preços. Diante desse quadro, parece razoável acrescentar à cesta básica artigos carregados de sódio, gordura e fatores de risco, como paio e salsicha?

A maioria da população acha que não. Noventa e quatro por cento das pessoas ouvidas pelo Datafolha disseram sim ao aumento de imposto para ultraprocessados, agrotóxicos, tabaco e álcool. Um avanço que possibilitaria à indústria arcar com parte do custo investido no tratamento de doenças causadas pelo uso desses produtos.

A Fundação Instituto de Pesquisa (Fipe) calcula em R$ 4,7 bilhões a receita gerada com a adoção de uma alíquota de 20% sobre bebidas ultraprocessadas (refrigerante, sucos de caixinha, chás prontos para consumo etc.). Recursos que poderiam, portanto, ser destinados ao SUS.

A cesta básica livre de ultraprocessados e a tributação de produtos que fazem mal à saúde e ao meio ambiente constituem medidas cruciais para melhoria da qualidade de vida da população. Esperamos que senadores, deputados e agentes do poder público se convençam de que mudanças de comportamento individuais, sozinhas, têm sido insuficientes e precisam ser estimuladas por um arcabouço de políticas públicas.

* Bruna Hassan, nutricionista, epidemiologista, pesquisadora em Saúde Pública da ACT Promoção da Saúde.

** Paula Johns, socióloga, mestre em estudos de desenvolvimento internacional pela Universidade de Roskilde, Dinamarca, diretora-executiva ACT Promoção da Saúde.

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