PALESTINOS JUDEUS, PALESTINOS JUDEUS



Eduardo Bonzatto*, Pragmatismo Político

O judaísmo é uma religião monoteísta e seus fiéis estão, como os cristãos, espalhados pelo mundo todo. Não é uma raça ou uma nacionalidade, é uma vocação religiosa completa.

Quando da formação dos Estados-Nação no século XIX, um grupo de judeus começou um movimento sionista para também construírem uma nação judaica.

Esse movimento nacionalista provocou uma série de repercussões, pois a criação de um estado judaico carecia de um território no cenário geopolítico conturbado da época.

Mas o sionismo, diferentemente das outras nações, tinha uma característica de ser um estado religioso e não laico como prescrevia as constituições em voga então na Europa e no mundo.

Um estado religioso, é preciso que se entenda o anacronismo, era visto como um problema e apenas as repercussões foram sentidas. Mas o processo já havia sido iniciado e pelos anos seguintes só ampliaria sua influência até se concretizar em 1948.

Outro movimento importante para nossa historicidade foi a formação dos estados árabes. No final dos anos 1920, os ingleses operavam como colonizadores no Oriente Médio e ali descobriram grandes jazidas de petróleo.

Sob as orientações de Churchill, o jovem, tem início um projeto de transformar as grandes tribos árabes em estados. A função dos Estados-Nação é a separação e animosidade entre as nações.

Os ingleses usaram seu poderio colonizador para empoderar algumas tribos e seus califas que identificaram como tendo suficiente influência sobre as tribos na região.

Assim nasceram as monarquias do Iraque e da Arábia Saudita em 1932 com o apoio também dos Estados Unidos ao modelo colonizador inglês. Em 1919, a Inglaterra já havia emancipado nas mesmas condições o Afeganistão.

O filme Lawrence da Arábia fornece uma leve compreensão do processo de lutas internas para a efetivação do projeto inglês para dominar os campos petrolíferos da região do Oriente Médio.

A partilha do Oriente Médio envolveu outro país colonizador, a França, que emancipou nas mesmas condições tensas o Líbano, a Síria em 1943 e 46 respectivamente, assim como a Jordânia em 1946 e o Egito em 1953 pela Inglaterra.

O Bahrein, o Catar, os Emirados Árabes e Iêmen do Sul em 1971 pela Inglaterra, o Kwait em 1961 pela Inglaterra e o Iêmen do Norte pela União Soviética em 1971.

Esse cenário que em si já era potencialmente conturbado, pois as tribos clânicas nunca deixaram de transitar pelo Oriente Médio, encontrou na decisão da ONU em 1948 de instalar no coração dessa zona o Estado de Israel, um estado religioso judeu no meio de monarquias muçulmanas.

Não foi uma decisão descuidado, pois tanto a Turquia quanto o Brasil haviam colocado a disposição terras para a fundação do reclamado Estado Judeu.

Mas os interesses da Europa e dos Estados Unidos ditaram o enclave, numa região de difícil autonomia, abastecida inteiramente pelas potências bélicas ocidentais, capitaneadas pelos Estados Unidos.

A expansão do território original judaico explica, por outro lado, a tensa relação com os palestinos e o surgimento de inúmeros grupos armados das características do terror na região, Hamas, Hezbollah, Fatah, além das redes de apoio de inúmeros países, dentre os mais importantes, o Irã.

As guerras travadas após a fundação do estado judeu foram muitas. A primeira, chamada de Nakba, que em árabe significa Catástrofe, ocorreu logo no início, entre 1948 e 49. A primeira guerra árabe-israelense. A guerra de Suez. A guerra dos seis dias. A guerra do Yom Kippur.

A potência do Estado judaico ganhou a simpatia da imprensa ocidental e para enfrentar essa narrativa, os grupos armados palestinos, o Hamas o principal, criaram a Intifada, a revolta das pedras.

A estratégia consistia em colocar garotos e garotas palestinas munidos de pedras para enfrentar os tanques israelenses diante das câmeras dos repórteres ocidentais e de como os soldados enfrentavam as pedras com balas e canhões.

Iniciada em 1987 até 1993, não conquistou a simpatia da Europa ou dos Estados Unidos, mas atraiu grupos de esquerda numa larga faixa de influências.

É preciso considerar outro aspecto importante dessa complexidade toda. A religião muçulmana é a que mais cresce no mundo justamente pelo seu espírito comunalista e seu crescimento é muito mais amplo do que o cristianismo e seu fundamento mais individualista.

Então, o enclave que estamos identificando é também um enclave civilizacional.

O Hamas preparou essa nova forma de Intifada, dessa vez como uma hecatombe bíblica, numa invasão pacientemente planejada para não levantar os sinais da inteligência militar israelense e americana, para consumar um ato terrorista supremo que faria uma única coisa com certeza: levantaria todo poderio militar israelense para dizimar Gaza.

Quanto maior for a retaliação, e os chefes militares de Israel já avisaram que a resposta vai modificar para sempre o Oriente Médio, quanto mais mortes forem produzidos na resposta, quanto mais destruição for contabilizada, mais o Hamas vence.

O terrorismo do Hamas teve essa única função, como as velhas Intifadas que buscavam chamar atenção da imprensa ocidental sobre a proporção dos contendores no conflito longo, de que garotos com pedras representavam os palestinos e tanques de alta tecnologia, esse poderio militar.

Então, nesse propósito, o terror foi a desculpa para o genocído e pelo jeito ele vai se completar. Mas o mundo está girando em torno da tragédia e torcendo para que ela se amplie.

Quanto mais dura for a retaliação, mais o Hamas vencerá. Se Israel destruir todo o Hamas, o Hamas vence. Essa é a função de uma Intifada, expor para o mundo o sacrifício. O terror serve para insuflar no poderio militar a energia para impetrar sua maior força, sua mais dramática resposta.

Foi a vitória do terror.

Em qualquer dos casos, o enclave prevalecerá. A primeira vítima da guerra é a verdade e no final, só os mortos são verdadeiros.

O horror….o horror……o horror.

*Eduardo Bonzatto é professor da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) escritor e compositor


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