COLÉGIO MILITAR CONSIDERA CABELO CRESPO ''NÃO ADEQUADO'' E EXPULSA ALUNA DE AULA

Colégio Militar expulsa menina de 13 anos de aula na Bahia após classificar cabelo crespo da aluna como “não adequado”. A adolescente voltou para casa aos prantos, se sentindo culpada e reclamando do próprio cabelo. Outros estudantes denunciaram episódios racistas na mesma instituição de ensino

Imagem: Reprodução | TV Bahia

Uma aluna do Colégio Municipal Dr. João Paim, em São Sebastião do Passé, na Região Metropolitana de Salvador (RMS), na Bahia, denuncia ter sofrido racismo por parte de um funcionário da instituição, que alegou que a menina estava com o “cabelo inchado”. O caso aconteceu em 21 de março.

Eloah Monique Tavares chegou ao local com o cabelo preso em coque, mas sem estar envolto em uma rede, como é exigido no local. A estudante conta que o inspetor não questionou a falta da rede, mas mandou a aluna alisar os cabelos.

“Cheguei lá com os alunos, como todo mundo. E, quando chegou na minha vez, ele [o inspetor] disse: ‘Aluna, você não está adequada para este colégio’. Aí, ele disse assim: ‘Seu cabelo está inchado, e você precisa alisar mais ele’.”

A mãe da aluna, Jaciara de Jesus Tavares, de 31 anos, explica que a sua filha foi para o colégio com o cabelo preso em um coque e, mesmo assim, foi considerada inadequada para assistir às aulas. Eloah Monique, 13, foi mandada para casa, sem aviso prévio aos seus responsáveis.

“Na hora que o funcionário mandou ela ir para casa, ela ainda tentou arrumar mais o cabelo, puxar esticar mais para manter o padrão dele, de liso. Mas ele disse que não adiantava e que ela teria que voltar para casa”, relatou a mãe.

Jaciara diz que a filha chegou em casa chorando muito, constrangida pela situação, dizendo que não queria mais estudar no colégio e, no momento de raiva, chegou até a xingar o próprio cabelo.

Segundo Jaciara, quando ela foi ao colégio para conversar com o funcionário, ele mostrou a ela uma foto de um modelo padrão para que ela entendesse como que a filha deveria ir assistir às aulas. “Ele me mostrou a foto de uma menina branca com o cabelo liso. Eu falei para ele: ‘Essa não é a realidade da minha filha, o cabelo dela é duro e muito cheio”, contou a vigilante.

Depois, de acordo com a mãe, o funcionário chegou a afirmar que a menina deveria, sim, alisar o cabelo para se manter no padrão do colégio. Outra reclamação da mulher foi o fato da escola ter mandado sua filha de 13 anos para casa sem um aviso prévio. “Ele constrangeu ela, não deixou ela assistir aula e ainda colocou a vida dela em risco”, finaliza.

A Polícia Civil informou que Jaciara registrou um boletim de ocorrência do caso e que a Delegacia Territorial de São Sebastião do Passé vai apurar a denúncia.

Em nota, o Colégio Municipal Doutor João Paim informou informou que, ao matricular os estudantes, pais e/ou responsáveis são orientados sobre as normas disciplinares da instituição, e que recebem cartilhas e cópias do regimento interno.

Disse ainda que a escola segue o regimento padrão do ensino militar, que inclui regras disciplinares e normas sobre vestimentas, penteados, cortes de cabelo, fardamento, uso de calçados e outros itens.

Defensoria Pública acompanha caso

O caso chegou à Defensoria Pública do Estado da Bahia (DPE-BA), que acompanha a situação, segundo a defensora Eva Rodrigues.

“Tão logo a gente tomou conhecimento da notícia, a Defensoria Pública procurou o colégio, solicitando informações sobre o caso, e pedindo também esclarecimentos sobre as condutas adotadas pela escola, quando acontecem casos de racismo na escola”, explicou Eva.

Neste ano, a DPE-BA criou o selo “escola antirracista”. A instituição também lançou um livro com quatro contos e orientações aos pais, além de dicas e leitura. A defensora Larissa Rocha explicou que o objetivo é diminuir as práticas racistas no ambiente escolar.

“Neste ano, o foco da campanha é uma educação sem racismo. Infelizmente, a gente sabe que a escola é um ambiente que reproduz práticas, é uma instituição que está dentro de uma sociedade que é estruturalmente racista“, afirmou ela.

“Crianças e adolescentes negros sofrem racismo de maneira cotidiana, das mais diversas formas. Essa que a aconteceu São Sebastião do Passé é uma situação, muito provavelmente, de injúria racial. Porém, outras situações de racismo acontecem no ambiente escolar“.
Entidades Negras repudiam

O Coletivo de Entidades Negras (CEN) está acompanhando o caso da estudante por meio do corpo jurídico da organização. “Estaremos com ela e com sua família na denúncia deste caso até o fim. Juridicamente, o CEN também atuará para que a jovem tenha seus direitos garantidos, o acesso à escola permitido e os autores dos atos racistas contra ela punidos. Esperamos que assim nenhum negro do Brasil sofra mais casos como esse”, afirmou o coletivo.

O coletivo ainda afirmou que repudia qualquer tipo de discriminação, ainda mais aquelas praticadas contra signos e símbolos da cultura afro-brasileira. “São esses símbolos e signos que sustentam, ao longo de séculos, a identidade nacional do Brasil. Estamos em 2022 e já não é possível aceitar que agentes públicos ou privados atuem para excluir pessoas de espaços de acesso a direitos, como é a escola para o acesso à educação, simplesmente pela adesão dessas pessoas a formas diversas de vestimenta e estética”, declarou.

Com Correio24horas e G1


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