RADIALISTA QUE MANDOU CUSPIR EM LULA DIVULGA ESPÉCIE DE ''MEA CULPA''


Por medo de processo, locutor da RBS que incitou cusparada no ex-presidente Lula divulga retratação e diz que os comunicadores da empresa em que trabalha “prezam a vida, a família e os bons costumes” 



Locutor Alexandre Fetter está indignado porque ninguém, até agora, cuspiu no ex-presidente Lula 

Na semana passada, o locutor Alexandre Fetter, 48 anos, convocou os ouvintes do seu programa na Rádio Atlântida, pertencente à RBS – que também é dona do jornal Zero Hora, de emissoras de tevê afiadas da TV Globo e de outros empreendimentos empresariais –, a agredirem o ex-presidente Lula. 

“Ninguém cospe no Lula, velho? Que troço desesperador. Ninguém dá uma cuspida no Lula, um sujeito desses é digno de uma cusparada”, rosnou. Ameaçado de sofrer um processo, Fetter voltou atrás – a exemplo dos jovens que agrediram Chico Buarque e do“terrorista chic” João Pedrosa – e divulgou uma espécie de ‘mea culpa’. 

A nota diz que o “Grupo RBS possui um rígido código de ética e que todos os funcionários da empresa o seguem. Sendo assim, jamais usariam os microfones do veículo para fazer frente ao código de ética do Grupo RBS” 

O apresentador enfatizou que os comunicadores não incitam a violência e que “prezam a vida, a família e os bons costumes” 

O episódio levou o deputado federal Paulo Pimenta (PT/RS), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, a enviar uma carta aberta à RBS, criticando a postura do apresentador e o que considerou como “incitação ao crime”. 

Pimenta avança na crítica e afirma que a imprensa é uma das responsáveis pela onda de ódio e hostilidade no País. Para ele, o discurso do apresentador contribui para este cenário. 

Leia a íntegra da carta de Pimenta abaixo: 


CARTA ABERTA À RBS 

Desde que o desejo da maioria do povo brasileiro foi vitorioso nas eleições presidenciais, de 2014, e frustrou os interesses dos grandes grupos de comunicação do país, com a reeleição da Presidenta Dilma Rousseff do PT, o Brasil vive um clima de hostilidade, de extremismo e de inúmeros ataques, por parte daqueles que até hoje estão inconformados com a derrota nas urnas contra agentes políticos e, especialmente, membros do Partido dos Trabalhadores. Infelizmente, essa onda de ódio é, em grande parte, promovida e alimentada pela imprensa brasileira.

Foi o que puderam constatar os milhões de gaúchos e gaúchas ouvintes da Rádio Atlântida FM, do Grupo RBS, nessa semana. Indignados, muitos me procuraram para que fossem tomadas providências e o caso fosse denunciado. 

Em um dos programas de maior audiência dessa rádio do Grupo RBS, o locutor do “Pretinho Básico” incita os ouvintes a “cuspirem” na cara do ex-Presidente Lula. Entre as inconformidades do locutor estão, segundo ele mesmo, a possibilidade de que [eles, o povo] “vão votar no PT de novo” e o teor das últimas declarações do ex-presidente. “Ninguém cospe no Lula, velho? Que troço desesperador, isso é desesperador. Ninguém dá uma cuspida no Lula, um sujeito desses é digno de uma cusparada”. A incitação ao crime, cometido pelo locutor, está prevista no Código Penal. 

Qual seria a reação da mídia se agentes políticos passassem a defender agressões a jornalistas em razão da manipulação diária promovida pelos meios de comunicação no país, da seletividade de sua cobertura ou da diferença de posições políticas? Certamente, denunciaria um ataque à liberdade de expressão. E por que razão, então, consente com a incitação de ataques de seus profissionais a políticos? Pretende, ao fim, que alguns atores políticos sejam espancados ou retirados à força da cena política como na época da ditadura? 

Crimes ao microfone, como o cometido por esse locutor, respaldam, posteriormente, atitudes de violência na rua. Quem defende a doutrina do ódio contribui para a naturalização e o agravamento da violência praticada em nosso país. Ao permitir que tais palavras sejam proferidas em um de seus programas de rádio, o Grupo RBS fomenta a ideia de que vivemos em uma sociedade que valoriza a violência, a opressão e a vingança. Precisamos rejeitar esse pensamento. 

Vivemos em um Estado de Direito, onde a liberdade de expressão de cada indivíduo é tão importante quanto a certeza de que a dignidade da pessoa humana será protegida. Negar isso é recusar que somos todos iguais, afastando outro preceito fundamental do Estado de Direito. 

Esse discurso busca, na verdade, criminalizar a política e os agentes políticos, bem com, mais especificadamente, estigmatizar e discriminar não somente o ex-presidente Lula, seu partido e seus correligionários, mas todos brasileiros e brasileiras que, de alguma forma, estimam Lula e que têm ele e seu legado político como símbolos da tolerância, promoção da igualdade e da justiça social. 

O discurso de ódio leva a sociedade para um único fim. Foi o que vimos na Segunda Guerra Mundial, originada, em grande parte, da incitação ao ódio a grupos específicos de pessoas, num discurso promovido pelo casamento entre líderes políticos intolerantes e os meios de comunicação. 

Desde então a comunidade internacional e o sistema internacional de direitos humanos protegem a liberdade de expressão na mesma medida em que repudiam o discurso de ódio. Portanto, em episódios como esse da RBS, é inútil se esconder atrás da liberdade de expressão e invocá-la para justificar o cometimento de um crime. 

A humanidade de forma geral tem um alto grau de condenabilidade do discurso de ódio. Chegamos aqui após sofrer suas piores consequências. Por isso, em nosso país, vivemos para a defesa da pluralidade e para construção de uma sociedade que promova a paz. 

O que nos perguntamos, agora, é se: 

Essa é a opinião da RBS? 

A RBS concorda com incitação ao crime? 

A RBS concorda e defende que o ex-Presidente Lula seja agredido? 

A RBS aceita ser corresponsabilizada por qualquer agressão ao ex-Presidente Lula? 

A RBS considera que o papel da imprensa é incitar ao crime e promover o discurso de ódio? 

A RBS pretende tomar alguma providência frente a esse episódio de incitação ao crime? 

À parte as diferenças ideológicas entre o Partido dos Trabalhadores e a defendida pelos grandes grupos de comunicação, entendemos que não é no campo da violência que as disputas entre o campo político e o midiático, ou entre modelos políticos para o país, serão resolvidas.

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