BRASILEIROS NA IRLANDA DENUNCIAM AGRESSÕES XENOFOBIA

''Puta'. Foi como um rapaz que eu conheci me chamou quando falei que era brasileira. Revidei a ofensa e algumas de suas amigas se aproximaram e começaram a me xingar e bater. Quando caí no chão, chutaram minha cabeça. Quem chuta a cabeça de alguém assim? Nunca vi isso". Confira mais relatos a seguir

O estudante Bruno Omena, 21, diz ter levado uma ovada no olho em Dublin (Reprodução)


“‘Puta’. Foi assim que um rapaz que eu tinha acabado de conhecer na rua me chamou quando eu falei que era brasileira. Depois que eu revidei a ofensa, algumas amigas dele se aproximaram e começaram a me xingar e me bater. Quando caí no chão, chutaram minha cabeça. Quem chuta a cabeça de alguém assim? Nunca vi isso.”

É dessa maneira que a paulista Maria Guimarães, 23, estudante, se lembra da violência que sofreu em Dublin, na Irlanda. Assim como Maria, diversos outros brasileiros afirmam ter sofrido preconceito e xenofobia no país.

Encontrar esses relatos de agressão física ou ofensas por parte de irlandeses não é difícil. Com mais de 11 mil brasileiros morando na Irlanda (segundo a imigração do país europeu), os casos se repetem. Em 2014 os brasileiros foram responsáveis por 12% dos pedidos de visto para permanência no país – maior índice entre os países de fora da Europa.

Uma das histórias mais comuns inclui ser alvo de ovadas nas ruas. Bruno Omena, 21, estudante, estava trabalhando quando passou por essa situação e correu o risco de perder a visão de um dos olhos.

“Aqui em Dublin eu trabalho transportando os turistas pela cidade em uma bicicleta. Uma noite, um grupo de dez irlandeses jogou ovos em mim e um deles acertou em cheio meu olho. Por sorte, foi só o susto. É isso que você ganha por mudar para outro país”, conta.

Já casos mais leves acontecem sem ofensas explícitas, de forma velada. O supervisor comercial Everton Roberto da Silva, 26, de Santa Catarina, conta como acabou sendo enganado.

“Fui até um lugar procurar peças para minha bicicleta. Os irlandeses da loja disseram que não possuíam o produto, mas me passaram o endereço de outro lugar onde tinha. Quando cheguei lá, era um cemitério. Depois percebi que eles estavam rindo de mim quando o rapaz digitou o endereço no meu celular. É triste pensar que no fundo eles querem que a gente morra.”

Apesar de tantas histórias, o departamento de estatísticas do governo irlandês relata apenas seis ocorrências de xenofobia desde 2003. Os casos de racismo somam 1.399 no mesmo período.

Esses números são muito inferiores aos registrados pela instituição independente Enar (Rede irlandesa contra o racismo, em português), que recolhe denúncias pelo site Report.ie. Somente entre os meses de outubro de 2013 e dezembro de 2014 foram cerca de 500 ocorrências envolvendo xenofobia e racismo.

“Não há dados oficiais confiáveis sobre o racismo na Irlanda. Isso porque o governo não registra as denúncias corretamente ou as vítimas não têm fé na justiça e não reportam os casos”, explica Shane O’Curry, diretor da organização.

O departamento de polícia irlandês, chamado de Garda, afirma que existe uma política específica contra os crimes de ódio.

“A polícia irlandesa tem realizado ações para melhorar sua interação com diversas comunidades. Há um departamento específico dentro do órgão, que tem a responsabilidade de coordenar, acompanhar e aconselhar as diversas comunidades da Irlanda. Além disso, existem 349 oficiais treinados e destinados a trabalhar com as minorias.

O objetivo é promover a tolerância, respeito e compreensão, evitando os crimes de ódio, além de prestar assistência às vítimas”, afirma um comunicado emitido pela polícia.

“As ações da Garda foram recentemente citadas pela Comissão Europeia de combate ao racismo, como bons exemplos aos outros países”, completa o material divulgado. As penas para crime de ódio no país são até dois anos de prisão e multa de até 25.500 euros (cerca de R$ 102 mil).

Os brasileiros que passam por esses problemas podem solicitar ajuda à embaixada em Dublin. O órgão presta atendimento aos brasileiros e oferece aconselhamento.

“Nos casos de agressão, ouvimos os relatos e prestamos orientação. Geralmente, é sugerido que as vítimas procurem os órgãos competentes para lidar com situação, como a polícia local, e prestem queixa. Caso um inquérito seja instaurado para apurar o ocorrido ou haja um processo na justiça, o setor consular, se solicitado pelo cidadão, pode acompanhar as audiências”, conta Carolina Miceli, vice-cônsul da embaixada brasileira.

Flávio Carneiro, UOL

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