UM AMOR EM TEMPOS DE CÓLERA

"Empédocles ensinou que dois princípios dirigem os eventos na vida, no universo e na psiquê. Disse que esses princípios estão perenemente em guerra um com o outro. Ele chamou esses princípios de φιλία (Amor) e νεῖκος (Discórdia)." [Sigmund Freud]

Foto: Lula e Janja


Hoje é o dia do casamento de Lula com a sua Janja. Amor é a palavra e é também o afeto. Não há força maior do que essa, a do amor que junta, une, liberta, agrega, cura, cria e transforma.
É compreensível que o ódio, o ressentimento ou a discórdia, não possam ocupar o mesmo lugar o qual o amor resolve se instalar. Não cabe. Amor e ódio não ocupam o mesmo espaço, no tempo.

E essa reflexão físico afetiva me traz à memória que no texto Análise terminável e interminável (1937), já próximo ao fim da sua vida, Sigmund Freud fez uma afetuosa e demorada alusão ao filósofo siciliano Empédocles.
Nesse texto, Freud revela que algumas ideias do filósofo Empédocles são idênticas a aspectos importantes da sua doutrina dualista das pulsões (a de vida e a de morte).

Em tom de confissão, o criador da psicanálise responsabilizou a ocorrência de um “eclipse de memória” pelo fato de só tardiamente ter conseguido lembrar e reconhecer o impacto das leituras dos poemas de Empédocles na sua própria mente, ao longo de sua vida.
Dizendo se tratar de uma das figuras mais notáveis da Antiguidade Grega, Freud assumiu o seu fascínio pela multifacetada personalidade de Empédocles, lembrando ter sido ele não apenas um político, um sofista, um poeta e pensador místico, mas, também, um médico que conhecia profundamente as ciências naturais.

Nas palavras de Freud, Empédocles ensinou que o universo, a vida e as psiquês humanas são dirigidas por dois princípios: φιλία (Amor) e νεῖκος (Discórdia), isto é, o amor e o ódio como motores da geração/criação e da desintegração/destruição, do nascimento, da vida e da morte.

Seguramente, há fortes componentes trágicos nessa visão cosmológica do filósofo Empédocles. A sombra da força de uma reviravolta capaz de marcar com infortúnio um local, uma ou mais vidas que, de repente – como em uma peripécia trágica – passam a ser atingidas e influenciadas pela ação da desagregação, da separação, da discórdia e do ódio.

Entretanto, o contrário dessa imagem viva também ocorre. A ideia é a de que esses movimentos de criação e destruição, essas forças agindo, são algo contínuo; elas se alternam no movimento o qual chamamos de tempo. O amor e a discórdia não se estagnam fixamente como regentes da (as) vida (s), e esse é o incessante jogo de forças.

Vislumbrando isso, me parece ser compreensível que a ação da discórdia (ou do ódio) seja comumente acompanhada do medo. Afinal, o medo é um estado afetivo, uma emoção via de regra bastante alinhada com possibilidades de desintegração, de perda ou morte, enfim.
Em sua mais intensa expressão, o medo dá vez à angústia. E é também do medo, da angústia e da sensação de aniquilação que os brasileiros precisam se livrar. É como um aprisionamento no declive de uma depressão. É hora de girar isso.

Lula e Janja. Créditos: Ricardo Stuckert

Evidentemente que não é o único caso no mundo, certamente não é. Mas, vejam o caso de Lula. Depois de tudo o que viveu e de tudo o que passou nos últimos anos. Depois de toda a sórdida armação operada contra ele. Depois de todas as crueldades, injustiças tramadas e perdas, Lula ama. Se une, cria e se casa novamente. Sendo humano, de carne e osso, e não um mito ou herói, Lula se manteve firme, mesmo nos momentos em que o mundo desabou em cima dele.

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*Lucio Massafferri Salles é filósofo, psicólogo e jornalista. Doutor e mestre em filosofia pela UFRJ, concluiu o seu pós-doutorado em filosofia pela UERJ. É especialista em psicanálise pela USU e criador do Portal Fio do Tempo (You Tube).


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