"ANALISE" PUBLICADA NA FOLHA SOBRE MORTE DE MARÍLIA MENDONÇA REVOLTA INTERNAUTAS

Julgadas pela aparência até quando morrem: texto publicado na Folha ataca a memória de Marília Mendonça e questiona padrão estético da cantora que morreu na última sexta-feira

Imagem: reprodução


por Mariliz Pereira Jorge

As mulheres não deixam de ser julgadas por sua aparência nem quando morrem. Marília Mendonça não seria exceção. Fiquei pasma com o trecho da análise, publicada na Folha, sobre a trajetória da artista em que ela é retratada como “seu visual também não era dos mais atraentes para o mercado“, “gordinha e brigava com a balança”, “vinha fazendo regime radical“.

Não porque essas frases sejam o retrato da gordofobia e da misoginia que pautam a sociedade. O autor pode ter acreditado que apenas resumia uma impressão coletiva. Fiquei incomodada porque é uma visão preguiçosa sobre o que tem acontecido na sociedade, na qual Marília Mendonça se mostrou uma das maiores representantes de sua geração. Mas talvez o jornalismo não esteja preparado para isso.

Não é exagero dizer que a maioria das mulheres no meio artístico ainda se ajoelha ao que talvez ainda considere exigência da profissão. O sucesso viria se o combo “magra e jovem” fosse servido já no começo da carreira. Marília entregou logo de cara o seu talento e sua personalidade única para estremecer um mercado masculino e homogêneo, sem estar embalada no que os outros achavam ser ideal.

A identificação do público não veio apenas por meio das letras das músicas que exaltavam a mulher como protagonista de sua vida, mas com a própria Marília que, de carne e osso, representava muito mais a brasileira que ela canta em seus versos. Na sua beleza não plastificada, na exuberância de suas formas, nos figurinos chamativos. Marília poderia ser uma amiga, uma irmã, uma colega de trabalho como tantas que nós somos ou temos.
Marília nunca deixou de ser julgada

Quando não se enquadrava no padrão barbie do mundo artístico e, também, quando perdeu peso. A sociedade cobra respostas para tudo. Tanto faz suas motivações, se era por saúde ou por achar que se sentiria melhor com outra aparência. O julgamento sempre vem, sempre haverá alguém para dizer como cada um de nós deve se vestir, se parecer ou se pesar. O que não dá mais é que isso seja endossado pelos meios de comunicação.

O texto ao qual me refiro no início deve ter sido lido ao menos por duas ou três pessoas. Chama atenção que nenhuma delas tenha notado que a interpretação daqueles trechos seria “Marília fez muito sucesso apesar de ser gordinha“.

Para mim, Marília Mendonça foi um acontecimento porque deu voz às angústias femininas sobre o amor, empoderou afetivamente as mulheres por meio de suas canções e libertou o seu público das amarras com as quais a ditadura da beleza ainda tenta nos aprisionar. É também um sinal dos tempos, uma mudança linda nas novas gerações, de entendimento e de aceitação de que o corpo de uma mulher não a define como pessoa ou profissional.

Ela não será a última mulher a ser julgada por ser gorda ou magra, jovem ou velha, mas certamente deixou uma contribuição enorme para que muitas de nós simplesmente não se importem com o que os outros pensam.


Djamila Ribeiro também criticou a “análise”


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