POLÍCIA FEDERAL PEDE A PRISÃO DE DILMA ROUSSEFF, MAS STF REJEITA

Supremo Tribunal Federal impede que Polícia Federal prenda Dilma Rousseff em inquérito em que ela sequer é investigada. Sergio Moro é apontado como o responsável pela ação

   Dilma e Moro (Imagem: Reprodução/Polêmica Paraíba)

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, negou pedido da Polícia Federal para prender a ex-presidente Dilma Rousseff na operação que buscou provas, nesta terça-feira (5), contra os senadores Jader Barbalho (MDB-PA), Renan Calheiros (MDB-AL) e Eduardo Braga (MDB-AM). Eles são suspeitos de ter recebido R$ 40 milhões da JBS para apoiar a reeleição de Dilma em 2014.

Além da ex-presidente, também eram alvos de pedidos de prisão temporária o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, os ex-senadores Eunicio Oliveira (MDB-CE) e Valdir Raupp (MDB-RO) e o ministro do Tribunal de Contas da União, Vital do Rêgo Filho.

Em nota, a assessoria de Dilma classificou o pedido da Polícia Federal como absurdo, já que, segundo o comunicado, a ex-presidente não é investigada no caso. “Ainda bem que prevaleceu o bom senso e a responsabilidade do ministro responsável pelo caso no STF, assim como do próprio Ministério Público Federal”, destaca o texto.

Para a PF, os investigados poderiam prejudicar as investigações. “A privação da liberdade de locomoção destes indivíduos é indispensável para a identificação de fontes de prova e obtenção de elementos de informação quanto à autoria e materialidade das infrações penais investigadas”, sustentou a Polícia Federal.

Fachin, no entanto, seguiu entendimento da Procuradoria-Geral da República pelo indeferimento do pedido. A PGR argumentou que não havia evidência de que “em liberdade, os investigados possam atrapalhar a execução das medidas de busca e apreensão”.

O ministro corroborou o entendimento: “A pretensão de restrição da liberdade de locomoção dos investigados não se encontra provida da indicação de concretas condutas atentatórias às apurações que evidenciem a necessidade da medida extrema”.

“Moro usou PF”

A presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, acusou o ministro da Justiça, Sérgio Moro, de usar a Polícia Federal “descaradamente” para tentar prender Dilma. Para a deputado, Sérgio Moro usou “a PF para tentar criar escândalo e encobrir os crimes da família Bolsonaro no caso Marielle/Anderson”.

“Isso se chama estado policial. Nem estamos no AI-5 e o ministro da Justiça (!) usa descaradamente a força contra a lei e o direito”, escreveu ela.

Nota de Dilma

“NOTA À IMPRENSA

É estarrecedora a notícia de que a Polícia Federal pediu a prisão da ex-presidenta Dilma Rousseff num processo no qual ela não é investigada e nunca foi chamada a prestar qualquer esclarecimento.

A ex-presidenta sempre colaborou com investigações e jamais se negou a prestar testemunho perante a Justiça Federal, nos casos em que foi instada a se manifestar.

Hoje, 5 de novembro, ela foi convidada a prestar esclarecimentos à Justiça, recebendo a notificação das mãos civilizadas e educadas de um delegado federal. No final da tarde, soube pela imprensa do pedido de prisão.

O pedido de prisão é um absurdo diante do fato de não ser ela mesma investigada no inquérito em questão. E autoriza suposições várias, entre elas que se trata de uma oportuna cortina de fumaça. E também revela o esforço inconsequente do ministro da Justiça, Sérgio Moro no afã de perseguir adversários políticos. Sobretudo, torna visível e palpável o abuso de autoridade.

Ainda bem que prevaleceu o bom senso e a responsabilidade do ministro responsável pelo caso no STF, assim como do próprio Ministério Público Federal.

Assessoria de Imprensa

Dilma Rousseff”

Carta de Jean Wyllys

Em carta aberta, o ex-deputado Jean Wyllys comenta a tentativa de prisão de Dilma pela Polícia Federal “do cafona e medíocre Sergio Moro”. Leia abaixo.

Querida Dilma,

Meu coração simultaneamente apertou e acelerou quando li a notícia de que um delegado da Polícia Federal, aliado do ministro da Justiça de Bolsonaro, Sergio Moro, pediu sua prisão.

De imediato eu não pensei na explícita prática de lawfare que este pedido de prisão absurdo representa; não pensei na estratégia do canalha em criar, com este factóide, uma cortina de fumaça que impeça a maioria do povo brasileiro de ver a entrega do petróleo do pré-sal por parte do governo Bolsonaro (com apoio de plutocratas que apenas fingem se importar com o desapreço deste pela democracia); nem pensei nos ensaios de fechamento do regime que esses fascistas organizados em seitas religiosas e organizações criminosas fazem todo dia para testar os limites de uma nação agora adoecida por ter se recusado a trabalhar traumas como a escravatura e os terrorismos das ditaduras…

Ao ler a notícia, eu só pensei em você, minha amiga. Primeiro, naquela senhora que me abraçou demorado – seu cheiro bom, aquele cheiro de afeto que os filhos identificam em mães amorosas, ainda está está na minha lembrança como se eu tivesse acabado de lhe abraçar – naquele restaurante japonês em Copacabana, onde jantamos em companhia do historiador americano James Green. Aquela senhora que me aconselhou a sair do país por reconhecer que eu realmente estava correndo risco de morte. Aquela senhora que, num dado momento da conversa, chamou-me de “meu filho”…


Em seguida, lembrei-me de que aquela senhora amorosa é também a estudante da foto histórica em que, após dias sob tortura por parte de covardes idolatrados hoje pelos igualmente covardes que pediram sua prisão, você encara altiva seus torturadores, imorais que escondem suas caras na esperança de escapar do julgamento da história e da infâmia que a maldade joga sobre sua (deles) descendência…

Só depois dessa reação afetiva; dessa preocupação com a pessoa (que é avó e ama sua família); só depois disso, é que, relembrando o quanto nossas histórias individuais se entrelaçaram na trama da história do Brasil, por eu ter sido o primeiro ativista gay a chegar no Congresso Nacional e você a primeira presidenta – sim, presidenta – da república, dei-me conta dos significados políticos e dos perigos terríveis contidos nesse pedido de sua prisão.

As facções políticas (incluindo aí as organizações criminosas na cidade e no campo) que perpetraram o golpe contra seu governo – com o objetivo de garantir a si mesmas privilégios, lucros obscenos e impunidade em seus (delas, das facções) crimes – estão em guerra pelo poder desde então. A prisão do Lula, a intervenção militar no Rio de Janeiro feita pelo governo do crápula que lhe traiu e ao PT, Michel Temer, e a posterior execução de Marielle Franco são as consequências dessa guerra entre as forças políticas de direita que produziram a ruptura com a democracia em 2016.

Você sabe, Dilma, que nem mesmo o alinhamento dessas facções golpistas em torno da figura de Bolsonaro nas eleições de 2018 (àquela altura já instrumentalizada e turbinada pelos plutocratas da extrema-direita americana) garantiu a paz entre elas.

Os ricos brasileiros, os banqueiros ilustrados, os marajás do funcionalismo público, os donos de veículos de comunicação e os intelectuais endinheirados que fizeram da Lava Jato um complô e, do cafona e medíocre Sergio Moro, um fantoche, não esperavam que as facções criminosas com as quais se aliaram – milícias e seitas religiosas que servem de lavanderia para dinheiro sujo – fossem querer ter as rédeas do país. Mesmo assim, com todo o horror que elas vêm praticando, a Globo e a Folha de São Paulo seguem elogiando seu ministro da Economia, como se não se tratasse do mesmo governo fascista que ameaça a liberdade de imprensa, a cultura e a laicidade – e ignora emboscadas que matam os guardiões da Amazônia.

Dilma, não sei se você sabe, mas, naquela noite em que teve início o golpe disfarçado de processo de impeachment, logo depois de dedicar seu voto ao torturador Brilhante Ustra (o covarde que quebrou com um soco o maxilar daquela menina da foto que é você), Bolsonaro me xingou de “queima-rosca” e me disse “tchau, querida”, numa referência à frase que o Lula lhe disse na conversa grampeada ilegalmente por Sergio Moro e divulgada pela Globo. A misoginia e a homofobia – males gêmeos – exigiram-me uma reação naquele momento. Além delas, a memória dos mortos sob as torturas perpetradas pela ditadura militar.

Eu cuspi na cara dele por você, Dilma. Por nós.

E, por tudo isso, mas principalmente por você, a quem poderia chamar de “minha mãe”, mas chamo de “minha amiga”, eu lhe peço nesta carta aberta:

Tenha cuidado, amada! Os fascistas ressentidos de ontem e de hoje não toleram o que você representa, presidenta.

Te amo!

Jean Wyllys

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