PENSAR É TRANSGREDIR: O CAPÍTULO DE SUA VIDA, O FINAL, O SABER RESPIRAR

Ao escrever sobre os caminhos e escolhas que fazemos na vida a escritora Lya Luft transmite muitos ensinamentos para as páginas de nossas vidas: preocupação com o cotidiano e a inquietação pelo mistério da vida. A ternura, a felicidade e perplexidades.

''Mas pensar não é apenas a ameaça de enfrentar a alma no espelho: é sair para as varandas de si mesmo e olhar em torno, e quem sabe finalmente respirar. ( Pensar é transgredir'', Livro de Lya Luft). . .

''Somos demasiado frívolos: buscamos o atordoamento das mil distrações, corremos de um lado a outro achando que somos grandes cumpridores de tarefas. Quando o primeiro dever seria de vez em quando parar e analisar: quem a gente é, o que fazemos com a nossa vida, o tempo, os amores. E com as obrigações também, é claro, pois não temos sempre cinco anos de idade, quando a prioridade absoluta é dormir abraçado no urso de pelúcia e prosseguir, no sono, o sonho que afinal nessa idade ainda é a vida.

Mas pensar não é apenas a ameaça de enfrentar a alma no espelho: é sair para as varandas de si mesmo e olhar em torno, e quem sabe finalmente respirar.
Compreender: somos inquilinos de algo bem maior do que o nosso pequeno segredo individual. É o poderoso ciclo da existência. Nele todos os desastres e toda a beleza têm significado como fases de um processo'', ( Pensar é transgredir, Livro de Lya Luft). . .

E . . .

Para reinventar-se é preciso pensar: isso aprendi muito cedo.

Apalpar, no nevoeiro de quem somos, algo que pareça uma essência: isso, mais ou menos, sou eu. Isso é o que eu queria ser, acredito ser, quero me tornar ou já fui. Muita inquietação por baixo das águas do cotidiano. Mais cômodo seria ficar com o travesseiro sobre a cabeça e adotar o lema reconfortante: "Parar pra pensar, nem pensar!" . . .

Se nos escondermos num canto escuro abafando nossos questionamentos, não escutaremos o rumor do vento nas árvores do mundo. Nem compreenderemos que o prato das inevitáveis perdas pode pesar menos do que o dos possíveis ganhos.
Os ganhos ou os danos dependem da perspectiva e possibilidades de quem vai tecendo a sua história. O mundo em si não tem sentido sem o nosso olhar que lhe atribui identidade, sem o nosso pensamento que lhe confere alguma ordem.
Viver, como talvez morrer, é recriar-se: a vida não está aí apenas para ser suportada nem vivida, mas elaborada. Eventualmente reprogramada. Conscientemente executada. Muitas vezes, ousada.
Parece fácil: "escrever a respeito das coisas é fácil", já me disseram. Eu sei. Mas não é preciso realizar nada de espetacular, nem desejar nada excepcional. Não é preciso nem mesmo ser brilhante, importante, admirado, ( Canção das mulheres, livro de Lya Luft)

PERDAS E GANHOS

“Entendi que a vida não tece apenas uma teia de perdas mas nos proporciona uma sucessão de ganhos. O equilíbrio da balança depende muito do que soubermos e quisermos enxergar.” Uma mulher madura que já experimentou perdas e ganhos, mas mantém o otimismo, ama a vida, se diz “um bicho de sua casa” .  Neste primeiro livro seu publicado pela Record, a romancista, cronista e poeta convida o leitor para refletir ao seu lado, indagar, contemplar e admirar o mundo. "Não somos apenas vítimas de fatalidades", diz. "Somos também senhores de nossa vida." Num misto de ensaio e memórias, em PERDAS e GANHOS, Lya retoma diversos temas de O rio do meio, publicado em 1996, vencedor do prêmio de melhor livro da Associação Paulista de Críticos de Arte. Considera o ser humano ao mesmo tempo bom e capaz, fútil, medíocre e até cruel. Embarcado numa vida que é um dom, um mistério, e uma conquista a cada momento. Lya escreveu acreditanto; “a felicidade é possível, que não existe só desencontro e traição, mas ternura, amizade, compaixão, ética e delicadeza.” Sobre isso dialoga, aqui, com seu leitor. Entre alegrias, descobertas, decepções e buscas, em PERDAS E GANHOS, primeiro inédito desde as memórias de infância Mar de dentro, publicado em 2002 — a autora busca dar um testemunho pessoal sobre a experiência do amadurecimento. Convoca o leitor para ser seu amigo imaginário: cúmplice e companheiro de reflexões que vão da infância à solidão e à morte, ao valor da vida e à transcendência de tudo. Lya divaga, discute e versa, com ímpeto, compaixão, e muitas vezes bom humor, sobre velhice, amor, infância, educação, família, liberdade, homens e mulheres, gente de verdade... e conclui que o tempo passa mas as emoções humanas não mudam, revelando que é preciso reaprender o que é ser feliz. 

A autora morreu eu sua casa, dia 30 de dezembro de 2021, em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Lya Luft descobriu a doença já em estágio de metástase e chegou a ser internada em um hospital da cidade.


Lya Luft, ao longo da carreira, escreveu mais de 31 títulos, entre romances, poemas, contos, crônicas, ensaios, infantil e um livro de memórias. Recentemente, Lya foi homenageada pela Academia Rio-Grandense de Letras, com o troféu “Escritora do Ano” de 2021.

Luft nasceu em 15 de setembro de 1938, no município de Santa Cruz do Sul. A escritora deixa o marido, Vicente de Britto Pereira, e os filhos Suzana e Eduardo. Ela também tinha sete netos.

GAZETA SANTA CÂNDIDA, JORNAL QUE TEM O QUE FALAR

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