SEXTOU!

Reunião ministerial

Anderson Pires*

Parece brincadeira, mas não é. Caso você tenha programado uma Live para próxima sexta, melhor esquecer. O Governo Bolsonaro e nossas instituições do Estado Brasileiro são com certeza mais emocionantes.

Entretenimento em plena pandemia com direito a tramas inconfessáveis e indiscrições maiores que na época em que você usava o videocassete do seu pai para ver filmes x-rated.

O vídeo da reunião ministerial, no qual Moro dizia haver provas da intervenção política do presidente na Polícia Federal, estava carregado de cenas muito mais interessantes que as esperadas. A denúncia feita pelo ex-juiz virou piada do Juquinha, diante de todos os absurdos que foram vistos naquela reunião. Parecia mais a gravação de um guia eleitoral no mundo bizarro, onde os membros faziam elucubrações de toda sorte sem qualquer preocupação com ilegalidades, desrespeito a constituição, apologia a desobediência civil e até sugestão para que os Ministros do STF fossem presos.

Confesso que fiquei com receio que Bolsonaro fosse seviciado por tantos abusadores ao redor. Afinal, o que ouvimos de mais inocente foram os palavrões que soltou e sua preocupação com as hemorroidas. Se o foco era obter provas de interferência na PF não tivemos nada de novo.

A reunião mostrou que o Brasil é governado por um grupo de desequilibrados, sem qualquer escrúpulo em defender o uso do período da pandemia para quebrar os mecanismos de controle, que podem conter o entreguismo que esse Governo já demonstrou ser devoto.

O show de horrores teve o Ministro da Economia fazendo ilações ufanistas com relação a quebradeira da União e utilizando isso, como justificativa para que não fossem feitos investimentos com recursos públicos na recuperação do país. Aproveitou para fazer propaganda das ações que na sua ótica estariam salvando a economia brasileira. Parecia um curió cantado para o horizonte, sem perceber a tempestade que caia na suas costas. As medidas que o senhor Guedes adotou até agora só produziram recessão, aumento da informalidade e quebradeira no setor produtivo. Alguém está bem? Sim, os bancos, que enquanto todos sofrem acumulam lucros recordes. Mas economia boa para os liberais é aquela que os pobres se multiplicam e os especuladores comemoram.

Nunca pensei que iria admirar em uma reunião os que preferiram o silêncio. Pois, foram aqueles que não abriram a boca e o vice-presidente que brincava de caça palavras que tiveram a melhor participação.

Ao contrário, o Ministro da Educação, Abraham Weintraub, resolveu exorcizar a corrupção, listando quem deveria ser preso conforme acredita. Detalhe, sua pasta ainda precisa explicar algumas peripécias que aconteceram no último ENEM, como também o racismo que costuma manifestar. A vítima da vez foram os índios, assim, expôs seu ódio e sua visão colonialista.

Para não ficar para trás, o Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, deu dicas de como aprovar mudanças em códigos e leis para favorecer a grilagem e o desmatamento. Segundo ele, já que todos só pensam em covid-19, vamos fazer as escondidas mudanças que favoreçam aqueles que queiram praticar ilícitos. O que é mais uma delinquência para quem já responde a processos comprometedores?

Pois é, isso foi o que se extraiu da reunião ministerial que supostamente poderia tirar Bolsonaro da presidência. As falas dos ministros presentes apontam para a necessidade urgente de que as rédeas constitucionais sejam tomadas.

Independente de debates políticos que possam existir, o chamado Gabinete do Ódio não se resume a um grupo de piratas cibernéticos comandados pelo filho do presidente para distribuir fake news. Temos um conjunto de gestores que montaram um conluio para evadir riquezas e destruir as instituições.

Notem que aqui não faço qualquer discussão sobre o viés ideológico de quem ocupa as principais funções do Executivo. Tais absurdos poderiam ser ditos também por pessoas com orientação contrária as atuais autoridades. O que se torna inaceitável é o fato de que as propostas apresentadas propõem destruir valores que devem ser inalienáveis, seja qual for o Governo de plantão.

Propor armar cidadãos para desrespeitarem decisões baseadas na Constituição; apresentar dados econômicos que deixam claro que o desenvolvimentismo (que gera independência) está descartado, como também, políticas de incentivo ao setor produtivo a partir de investimento público; defender a quebra de códigos de controle ambiental e do patrimônio histórico; propor a prisão de Governadores alegando que o isolamento social seria o maior desrespeito aos direitos humanos; atacar índios e outros povos; acusar de forma indiscriminada o conjunto do funcionalismo e membros do Estado de corruptos; até a defesa da prisão de Ministros do Supremo.

O que falta para entendermos que a extrema-direita é uma parcela perigosa da sociedade?

O Brasil por mais episódios que tenha vivido ao longo da história, jamais teve provas tão cabais de práticas delituosas, que acarretam em prejuízo coletivo. Percebam que, numa reunião com dezenas de atores, não tivemos manifestações que ponderassem a situação provocada pela pandemia do coronavírus ou a exposição de projetos com alguma proposta de impacto social e econômico, principalmente, para os mais vulneráveis.

Se no começo do texto brinquei para desmarcarem as Lives de sexta, o show que Bolsonaro e seus ministros proporcionam cotidianamente demanda atenção especial. Por mais movimentação que gerem o entretenimento é da pior qualidade. Mas é necessário estar atento ao conjunto de ilegalidades e o desrespeito ao ser humano expresso de forma belicosa pelo Presidente e seus assessores. O perigo é dobrado: pretendem desconstruir o Estado Brasileiro e convocam os que carregam os mesmos valores, uma legião que beira os 30% da população, para legitimarem seus atos.

Por fim, a reunião teve um aspecto nostálgico. Na década de oitenta os quadrinhos e episódios na TV da Liga da Justiça fizeram muito sucesso. A Liga tinha como integrantes Superman, Batman, Supergêmeos e outros heróis que estavam sempre dispostos a combater o crime e salvar o mundo de catástrofes. Porém, também existia um mundo paralelo, conhecido como Mundo Bizarro, onde os mesmos heróis em versão antagônica compunham a Liga Bizarra e planejavam maldades e crimes de toda sorte. O que parecia ficção virou paródia do que vivemos no Brasil.

*Anderson Pires é formado em comunicação social – jornalismo pela UFPB, publicitário e cozinheiro.

 GAZETA SANTA CÂNDIDA, JORNAL QUE TEM O QUE FALAR

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