Kennedy Alencar: Dallagnol adotou discurso político em denúncia contra Lula

Para Kennedy Alencar, o Ministério Público Federal de Curitiba adota uma linha política muito clara na denúncia contra Lula. 
De acordo com o jornalista, sem "evidências" a acusação contra o ex-presidente "fragiliza" o procurador Deltan Dallagnol e "inflama o Brasil"
O procurador Deltan Dallagnol


Para o jornalista Kennedy Alencar, o Ministério Público adotou uma linha política na denúncia contra o ex-presidente Lula.

“A análise da denúncia exige uma separação entre o que foi um discurso político e as acusações técnicas. Nesse contexto, há uma parte da denúncia que tem um discurso político muito claro feito pelo procurador da República Deltan Dallagnol, que falou em ‘propinocracia’ no Brasil e em ‘perpetuação criminosa no poder'”, escreve ele.

“Num primeiro momento, Dallagnol fez um discurso político. A corrupção sempre existiu no Brasil, mas a explanação do procurador dá a entender que ela teria começado com o PT. O procurador fala da descoberta do maior escândalo de corrupção no Brasil”, diz o jornalista.

Kennedy lembra que o procurador, no início, “fez um preâmbulo político para falar que Lula era o ‘comandante máximo’ do esquema de corrupção na Lava Jato”. Mas “a respeito disso, a denúncia não traz evidências”.

Leia o texto de Kennedy Alencar na íntegra:

A análise da denúncia do Ministério Público Federal contra o ex-presidente Lula exige uma separação entre o que foi um discurso político e as acusações técnicas.

Nesse contexto, há uma parte da denúncia que tem uma linha política muito clara, um discurso político muito claro feito pelo procurador da República Deltan Dallagnol. Ele falou em “propinocracia” no Brasil e em “perpetuação criminosa no poder”.

Noutra parte da denúncia, houve uma exposição de detalhes das investigações sobre um apartamento no Guarujá, sobre uma reforma do sítio e sobre o armazenamento do acervo do ex-presidente Lula.

Num primeiro momento, Dallagnol fez um discurso político. A corrupção sempre existiu no Brasil, mas a explanação do procurador dá a entender que ela teria começado com o PT. O procurador fala da descoberta do maior escândalo de corrupção no Brasil.

No início de seu discurso, o próprio Dallagnol agiu de uma maneira defensiva. Quase pediu desculpas para poder fazer a denúncia. Disse que não estava julgando o partido A ou B, que não estava julgando o governo A ou B, que não estava julgando o que o Lula havia feito no governo nem a pessoa do ex-presidente. Dallagnol disse que estava ali para falar de uma conduta que o presidente havia adotado e que seria criminosa no entender dele. Em resumo, ele fez um preâmbulo político para falar que Lula era o “comandante máximo” do esquema de corrupção na Lava Jato.

A respeito disso, a denúncia não traz evidências. Fica na teoria do domínio do fato ao usar expressões na seguinte linha: “não existe outra conclusão possível”, “a corrupção no Brasil foi a maior que já se teve” e “não dá para o Lula dizer de novo que não sabia”. Essa é uma linha muito política.

Depois disso, os investigadores falaram de detalhes que necessitam de explicações do ex-presidente e que demonstram que eles obtiveram evidências e provas de que teria havido uma ocultação de patrimônio tanto em relação ao apartamento quanto em relação ao sítio.

Lula sempre negou isso. A defesa do ex-presidente divulgou nota dele e da mulher, Marisa Letícia.

Na parte em que trouxe detalhes técnicos, os investigadores apresentaram fotografias de caixas da mudança em que está escrito “praia” e “sítio”. O armazenamento de uma parte do acervo presidencial de Lula foi paga pela OAS para ficar sob a guarda da Granero. Essa parcela do acervo foi levada posteriormente para o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo. Em relação a isso, a denúncia traz detalhes, muitos dos quais já sabidos.

Numa outra parte, Dallagnol tem um discurso que evoca o mensalão. Foi apresentada uma peça de PowerPoint com Lula no centro de um sistema solar da corrupção. Claramente, há uma linha mais política nesse momento. A Lava Jato avança por esse caminho.

Já existe um duelo muito claro entre o Lula e os advogados dele e o juiz Sérgio Moro e os investigadores. É muito alta a chance de o petista ser condenado. É o ataque mais forte já feito a Lula em toda a carreira política dele.

Lula nunca sofreu uma acusação tão contundente. Na época do mensalão, por exemplo, não foi imputado a ele o comando do esquema criminoso que foi julgado pelo Supremo tribunal Federal. Agora, Dallagnol imputa a ele o comando máximo de um esquema de corrupção na Petrobras. E faz isso de uma maneira mais política. Ele não trouxe as evidências.

O procurador disse que o ex-deputado Pedro Correia afirmou, que os delatores disseram. Na parte em que se fala do apartamento, do sítio e do armazenamento do acervo, os investigadores mencionaram detalhes.

É preciso ver como serão os desdobramentos. Propinocracia é quase um conceito de filosofia política. É uma avaliação política. Quando um procurador da República faz isso, ele parece estar discursando da tribuna da Câmara ou do Senado. Ele entra numa linha política que o fragiliza.

É importante apurar uma conduta, apresentar a prova e imputar um crime. Isso seria mais inteligente para a Lava Jato, porque o que ocorreu hoje renderá um debate político no Brasil. Certamente inflamará o país.

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